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O trabalho pode influenciar o comportamento contraceptivo das mulheres?

29 jan 2021

Pesquisador responsável: Silvio da Rosa Paula

Título do artigo: EMPLOYMENT STATUS AND CONTRACEPTIVE CHOICES OF

WOMEN WITH YOUNG CHILDREN IN TURKEY

Autor do artigo: Didem Pekkurnaz

Localização da intervenção: Turquia

Tamanho da amostra: 2.608 mulheres

Grande tema: Gênero

Tipo de Intervenção: Analisar o impacto da situação laboral de mulheres com filhos pequenos sobre o uso de um método contraceptivo

Variável de Interesse principal: Métodos contraceptivos

Método de avaliação: Outros (Conditional Mixed Process (CMP), equações simultâneas,  Probit)

Contexto da Avaliação

De acordo com Instituto de Estudos Populacionais da Universidade de Hacettepe, entre 2003 a 2013, o uso de anticoncepcionais na Turquia passou de 71% para 73,5%. Durante o mesmo período, o uso de métodos contraceptivos modernos também aumentou de 42,5% para 47,4%, enquanto o uso de métodos tradicionais reduziu de 28,5% para 26%. Ademais, a participação na força de trabalho das mulheres com idades de 15 a 64 anos aumentou de 28,1% para 33,7%, fazendo com que a taxa de emprego das mulheres atingisse 29,6% em 2013. Mesmo apresentando uma tendência crescente da participação das mulheres no mercado de trabalho, essa tendência em geral tem sido menor do que para os homens e bem abaixo das médias observadas nos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Dentre as principais razões que explicam as baixas taxas de participação das mulheres no mercado de trabalho na Turquia, está a carga de cuidados com os filhos.

Detalhes da Metodologia

Em diversos estudos os pesquisadores estão interessados em estabelecer uma relação de causa e efeito. Para atingir tal objetivo, geralmente são utilizados os modelos de regressão. Neste estudo, os autores por meio de regressões buscam estabelecer uma relação entre os métodos contraceptivos e o mercado de trabalho das mulheres. No entanto, quando existe endogeneidade não é possível estabelecer uma relação direta entre causa e efeito, sendo necessário recorrer a outros métodos de regressão para estabelecer de forma correta essa relação, evitando inferências inadequadas.

No contexto deste estudo, os autores destacam um potencial problema de endogeneidade entre as variáveis de trabalho das mulheres e a escolha de anticoncepcionais, dado que é razoável supor que mulheres com habilidades acima da média, podem apresentar maiores probabilidades de estarem empregadas. Além disso, fatores relacionados ao emprego como, por exemplo, maior remuneração, podem afetar o comportamento contraceptivo, fazendo com que as mulheres adiem a decisão de ter filhos. Consequentemente, não é possível estabelecer uma relação direta de causa e efeito, uma vez que a escolha dos anticoncepcionais pode afetar o trabalho das mulheres e o trabalho pode afetar a escolha dos anticoncepcionais, caracterizando uma endogeneidade por simultaneidade.

Diante destas considerações, os autores recorrem ao estimador proposto por David Roodman (2011), conditional mixed process (CMP), que permitirá identificar a relação causal por meio de equações simultâneas, utilizando variáveis que afetam somente a situação de emprego das mulheres, mas não tem efeito sobre a decisão contraceptiva. As variáveis utilizadas para este fim, foram as taxas de emprego em nível de província e porcentagem de mulheres empregadas em um determinado setor (agricultura e manufatura). Sendo assim, com a utilização destes instrumentos, os autores esperam identificar corretamente a relação de causa e efeito.

Detalhes da Intervenção

Para a realização do estudo foram utilizados os dados da Pesquisa Demográfica e de Saúde da Turquia de 2013, que coleta informações sobre os vários aspectos da vida das mulheres como fertilidade, planejamento familiar, saúde infantil, saúde materna e situação de emprego de famílias que são escolhidas aleatoriamente. Ao total existem 9.746 mulheres na pesquisa de 2013. Entretanto, são utilizadas somente as informações de 2.608 mulheres, excluindo as mulheres grávidas, inférteis, que foram esterilizadas antes do ano da pesquisa, com parceiros esterilizados e com filhos menores de 6 anos.

As informações das mulheres selecionadas foram divididas em dois grupos principais. O grupo das mulheres que utilizam métodos anticoncepcionais tradicionais (abstinência periódica, coito interrompido e qualquer outro método folclórico), e o grupo que utiliza métodos modernos (pílula, DIU, injeções, diafragmas, preservativos, esterilização feminina e masculina, implantes e LAM). Ademais, são utilizadas outras informações como o número de crianças menores de 6 anos, entre 6 a 13 anos e entre 14 a 17 anos, a presença de adultos que não seja o marido, nível de educação da mulher, nível de educação do marido, fertilidade ideal, índice de riqueza, se reside em região urbana ou rural, se é funcionária pública, informal ou outros empregos e disponibilidade de creches no município.

Resultados

Os resultados apontam que as mulheres que trabalham apresentam uma maior probabilidade de usar um método anticoncepcional, do que as mulheres que não trabalham. Esse resultado corrobora com a hipótese de que as mulheres mais voltadas ao mercado de trabalho possuem um custo de oportunidade maior de criação dos filhos quando comparadas com mulheres que não trabalham. Desta forma, estariam mais inclinadas a usar um método anticoncepcional para evitar uma gravidez não intencional. Além disso, as mulheres empregadas apresentam maiores probabilidades de utilizarem métodos contraceptivos modernos em vez dos tradicionais, quando comparadas com mulheres que não trabalham. Uma das explicações, diz respeito a capacidade de pagar por métodos contraceptivos mais modernos.

Ademais, os resultados indicam que um aumento na oferta pública de creches e
instituições pré-escolares aumenta a probabilidade de emprego para mulheres com filhos pequenos. Por outro lado, uma maior proporção de serviços privados de creche leva a uma menor probabilidade de emprego, uma vez que não são acessíveis para muitas famílias. Por fim, comparando mulheres com base na categoria de trabalho, em particular, mulheres do serviço público e mulheres em outras condições de trabalho remunerado, os resultados indicam que as funcionárias públicas são mais propensas a utilizarem métodos modernos em relação aos tradicionais, corroborando com a hipótese de que o acesso a métodos modernos seja fácil para mulheres que trabalham em empregos de alto status e com melhores remunerações.

Lições de Política Pública

No presente estudo, os autores investigam o impacto da situação laboral das mulheres com filhos abaixo da idade da escola primária, sobre o uso de métodos contraceptivos. Apesar de existirem diferenças entre o Brasil e a Turquia, com relação as políticas públicas de acesso a métodos contraceptivos, os resultados são interessantes para compreender os fatores que influenciam a  inserção da mulher no mercado de trabalho.

Outro resultado importante do estudo que converge para a realidade brasileira, seria a importância da disponibilidade de creches públicas. Segundo o estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base em dados do Censo de 2010, o nível de ocupação das mulheres com filhos de até três anos de idade que frequentavam creche era de 65,4%,  superior ao daquelas cujos filhos não frequentavam creche, que era de 41,2%. Diante desta realidade, atingir as metas estabelecidas do Plano Nacional de Educação (PNE), de garantir que pelo menos 50% das crianças entre 0 a 3 anos estejam matriculadas em creches até 2024, seria um fator importante para promover uma maior participação das mulheres no mercado de trabalho no Brasil.

Referência

PEKKURNAZ, Didem. Employment Status and Contraceptive Choices of Women With Young Children in Turkey. Feminist Economics, v. 26, n. 1, p. 98-120, 2020.