Pesquisadora responsável: Eduarda Miller de Figueiredo
Título do artigo: FUNCIONALISMO PÚBLICO E DESIGUALDADE DE RENDA NO BRASIL
Autores do artigo: Francine Martinez Braite e Vladimir K. Teles
Localização da intervenção: Brasil
Tamanho da amostra: 27 estados (1986-2011)
Setor: Política Econômica & Governança
Tipo de intervenção: Salários e desigualdade de renda
Variável de interesse principal: Índice de Gini
Método de avaliação: Outros
Problema de Política
A desigualdade no Brasil vem diminuindo desde a década de 1990, tendo uma aceleração na redução a partir dos anos 2000, porém, continua sendo um dos países do mundo com maior desigualdade de renda. Essa redução é uma consequência das alterações feitas na estrutura da sociedade através do aumento da proporção de adultos igualando a renda per capita dentro de um mesmo grupo, programas de transferências governamentais, escolaridade da educação, diminuição da discriminação por raça e gênero, entre outros (Barros et al., 2006).
As diferenças nas rendas obtidas entre o setor privado e público podem implicar em diferenças nos indicadores de desigualdade, visto que os salários recebidos pelo funcionalismo público são mais elevados quando comparados aos salários do setor privado. Ademais, o setor público tem um tamanho significativo, onde as regras de salário não acompanham o padrão do mercado.
Ao analisar o caso da desigualdade no Brasil, Hoffmann (2006) introduziu diversas variáveis importantes para o contexto do país, sendo algumas delas as transferências governamentais e o valor pago de pensão e aposentadorias. Em seu achado, observou que as transferências governamentais possuem um papel relevante para a redução da desigualdade, ao contrário do valor pago de pensão e aposentadorias, que atuam na direção do aumento da desigualdade.
Contexto de Avaliação
Para analisar a desigualdade de renda do Brasil é necessário estudar a história da economia brasileira. Na década de 1970 a economia brasileira viveu um intenso crescimento econômico que foi afetada pela crise do petróleo que assolou todo o mundo no final da década. Entre 1980 e 1990, o país enfrentou a instabilidade política advinda do fim da ditadura e a hiperinflação. Em seguida, o Plano Real em 1994 fornece a estabilização que concede um período de crescimento mais sustentável que durou até a primeira década dos anos 2000.
Figura 1: Evolução da distribuição de renda no Brasil
Pelo gráfico apresentado na Figura 1, observou-se que o índice de Gini[1] e os indicadores de participação de 1% e de 10% dos mais ricos na renda caem na década de 80, mas nos anos finais da década voltam aumentar, perdurando em níveis altos até o início dos anos 90. A situação se altera após o Plano Real, quando os índices de desigualdade começam a reduzir, porém, mesmo com esta redução, a desigualdade de renda do Brasil ainda possui níveis elevados em relação ao resto do mundo
.No final da década de 1970 e início de 1980, fica evidente a disparidade entre o grau de concentração de renda entre os 1% mais ricos e os 50% mais pobres. Na qual a parcela apropriada pelos mais ricos nesse período era maior ou igual à apropriada pelos mais pobres para praticamente todo o Brasil, em que a diferença maior foi em 1977 para a região Centro-Oeste. Assim como os indicadores de desigualdade, a partir do meio dos anos noventa, a situação apresenta uma melhora, na qual a região Sul em 2014 atingiu o menor nível de apropriação pelo 1% mais rico.
Segundo o estudo realizado pelo FMI (2015), no período entre 1990 e 2012 observou-se um aumento da desigualdade de renda nos países desenvolvidos com aumento da renda no topo da distribuição, ao contrário do que ocorria no Brasil. Já nos países com economias emergentes, o estudo constatou uma maior absorção da renda pela parcela da população com renda mais baixa.
Detalhes da Política
Para analisar quais os fatores que contribuíram para a queda da desigualdade de renda no período de 1991 a 2011, os autores utilizaram variáveis de controle como educação, taxas de desemprego, tamanho do Estado, proporção de pobres na economia e programas sociais do governo. Tais variáveis foram adicionadas ao modelo visto que impactam a desigualdade de renda.
Foi empregado um modelo com dados em painel dinâmico, denominado System-GMM, no qual inclui-se a variável dependente (índice de Gini) defasada como fator explicativo no modelo. Para isso, utilizaram cinco períodos de tempo para os 27 estados brasileiros: 1986-1991, 1991-1996, 1996-2001, 2001-2006 e 2006-2011.
Apesar de haver um conjunto de estudos sobre a desigualdade de renda no Brasil, poucos estudos possuem como foco as diferenciações nas rendas obtidas entre o setor público e o setor privado e a consequência dessa diferença nos indicadores de desigualdade. Para tanto, o artigo se propôs a entender essa possível relação através de uma nova variável dependente, o índice de Gini do setor público. A principal motivação para estudar tal distinção entre setores, dá-se pelo fato de os salários do funcionalismo público serem mais elevados em relação ao setor privado, em que houve um aumento de 35% para funcionário do setor público entre 1992 e 2005, em comparação à apenas 4% do setor privado.
Resultados
Os resultados encontrados pelos autores demonstram que o crescimento econômico possui um impacto negativo no índice de Gini para o período analisado. Entretanto, encontraram que a variável que indica os anos médios de estudo dos indivíduos acima dos 25 anos teve um papel importante para reduzir a desigualdade de renda no Brasil. Através da variável que continha a medida de proporção das transferências governamentais[2] em relação ao PIB do Estado, verificou-se a importância das políticas sociais governamentais na redução da desigualdade no período.
Já ao interagir o percentual da população vivendo abaixo da linha da pobreza com o crescimento econômico, os autores observaram que, apesar do crescimento econômico gerar efeitos na redução da desigualdade, quanto maior for a proporção de pobres na economia menor será o impacto do crescimento econômico na redução da desigualdade de renda. Sendo que, quando a proporção de pobres alcançasse 55%, o impacto do crescimento se tornaria nulo.
Quando foi utilizado o índice de Gini do setor público como variável dependente, os resultados diferiram, demonstrando que as transferências governamentais possivelmente beneficiaram uma parte da população que não está incluída na classe do funcionalismo público e, por isso, não é relevante para a redução da desigualdade para o setor. Já o índice de Gini do setor privado demonstrou que a aceleração do crescimento econômico tem impacto nas ofertas de emprego, aumentando os salários e reduzindo a desigualdade.
Ao mensurar se os impactos são de caráter permanente ou temporário, supôs-se que o índice de Gini se estabilizaria no longo prazo e assumiria um valor constante. A variável de educação apresentou resultados que demonstram que ela possui efeitos permanentes na redução do indicador de Gini, sugerindo a importância da educação como fator responsável para reduzir a desigualdade de renda no Brasil no longo prazo. Já em relação aos programas sociais do governo, os resultados evidenciam que os programas foram importantes para a redução da desigualdade no período do estudo, mas possuem um alcance reduzido no longo prazo.
Lições de Política Pública
O estudo demonstra que para o caso brasileiro, o crescimento econômico e a educação foram fundamentais para a desigualdade de renda no curto prazo, referente ao período estudado, assim como para o longo prazo. Ademais, registra-se a importância da proporção de população abaixo da linha da pobreza, visto que, quanto maior for a proporção menor será a eficácia do crescimento econômico e a consequente redução da desigualdade de renda.
Referência
BRAITE, Francine Martinez et al. Funcionalismo público e desigualdade de renda no Brasil. 2018.
[1] O Índice de Gini é um instrumento para medir o grau de concentração de renda em determinado grupo, apontando a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos
[2] Benefício de Prestação Continuada e Assistência Social, Renda Mensal Vitalícia e Bolsa Família.