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A RESOLUÇÃO 3.545 TEVE EFEITO NA REDUÇÃO DO DESMATAMENTO?

26 jan 2022

Pesquisadora responsável: Eduarda Miller de Figueiredo

Localização da Intervenção: Amazônia

Tamanho da Amostra:

Setor: Meio Ambiente

Variável de Interesse Principal: desmatamento

Tipo de Intervenção: Resolução 3.545 – Crédito Rural

Metodologia:  Diferenças em Diferenças

A Resolução 3.545, de 2008, tornou a concessão de crédito subsidiado na Amazônia à comprovação do cumprimento dos requisitos legais de titulação e normas ambientais. Em vista disso, os autores buscam avaliar o impacto efetivo da resolução sobre o desmatamento dentro do bioma amazônico. Através de dados em painel compostos por informações do INPE e do Banco Central, utilizou-se a metodologia de Diferenças em Diferenças para produzir estimativas. Os resultados são significativos e sugerem uma redução de 60% no desmatamento. Foram encontrados efeitos heterogêneos para diferentes atividades e regiões, o que demonstra que a resolução é uma política complementar e não substitutiva.

Problema de Política

Das últimas emissões globais de gases de efeito estufa, quase 20% é atribuído ao desmatamento tropical. E, em razão disso, os formuladores de políticas do mundo todo têm se dedicado para implementar um conjunto de políticas baseadas em incentivos que auxilie na redução do desmatamento.

O artigo tem como objetivo avaliar o impacto da Resolução 3.545 sobre o desmatamento, visto que tal resolução representou uma potencial restrição ao acesso ao crédito rural, que é um dos principais mecanismos de apoio à produção agrícola.

Contexto de Implementação e de Avaliação

Em 2008, o Banco Central do Brasil publicou a Resolução 3.545, que tornou a concessão de crédito subsidiado na Amazônia à comprovação do cumprimento dos requisitos legais de titulação e normas ambientais. Ademais, esta resolução está aplicada exclusivamente aos imóveis dentro da definição administrativa do bioma amazônico, de forma que propriedades fora do bioma não estão sujeitas à política.

A Resolução 3.545 determinou que a elegibilidade para o acesso ao crédito rural deve estar condicionado à apresentação, por parte do recebedor do crédito: (i) da Certidão de Cadastro de Estabelecimento Rural, que comprova que o imóvel que hospeda o projeto a ser financiado está devidamente contabilizado em registros federais; e (ii) de um documento emitido pelo Estado atestando a regularidade do estabelecimento que acolhe o projeto a ser financiado, bem como a declaração que a propriedade não está sob nenhum embargo[1] originado por causa de desmatamento. Em que os produtores que temiam que a resolução pudesse afetar seu acesso futuro ao crédito poderia sinalizar uma intenção de mudar o seu comportamento de desmatamento no futuro e, assim, ser considerado em conformidade com a regulação ambiental no momento atual.

Importante salientar que logo após a adoção compulsória da resolução, novas medidas afrouxaram os requisitos para a concessão de crédito rural para pequenos produtores, principalmente através da inclusão de novos grupos de pequenos produtores para a lista de tomadores de crédito que ficaram isentos do cumprimento dos requisitos originais da Resolução 3.545.

Detalhes da Política/Programa

Para a análise foi utilizada um conjunto de dados em painel de 2003 a 2011 de município por ano. Foi utilizado um mapa georreferenciado contendo a localização dos municípios e os limites do bioma da Amazônia, que possibilitou a criação de subamostras de municípios, dentro e fora do bioma da Amazônia, localizados a distâncias específicas da fronteira do bioma, conforme demonstrado na figura abaixo:

Figura 1: Bioma Amazônia Brasileira e Amostra de Benchmark

Os dados sobre o desmatamento foram construídos a partir de imagens de satélite do Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE) no âmbito do Projeto de Monitoramento de Desmatamento na Amazônia Legal (PRODES). Os autores definem o desmatamento como a área de floresta em quilômetros quadrados desmatada nos doze meses que antecedem agosto de um determinado ano. Por essa razão, foram recodificados os empréstimos de crédito e todas as outras variáveis para este período, em que o ano t irá se referir aos doze meses que antecederam agosto de t.

Também foram usados dados de nível de contrato administrativo compilado pelo Banco Central para construir as variáveis de crédito rural a nível de município a partir de dados no Cadastro Comum de Operações Rurais. Tal conjunto de microdados administrativos abrangem todos os registros de contratos rurais negociados por bancos oficiais e cooperativas de crédito.

Método

O fato da Resolução 3.545 apenas se aplicar aos imóveis localizados dentro do bioma amazônico, gerou uma clivagem geográfica explícita entre dois grupos de municípios: (i) os inteiramente dentro do bioma amazônico e, por isso, sujeitos à resolução; e (ii) os inteiramente fora do bioma amazônico, que não estão sujeitos à resolução. Com isso, o gripo de tratamento será composto pelos municípios do primeiro grupo, enquanto o grupo de controle possui os municípios do segundo grupo.

Deste modo, os autores utilizam Diferenças em Diferenças para avaliar o impacto da Resolução 3.545 sobre o desmatamento. A variável de interesse do estudo é a interação de uma variável binária que indica se o município está localizado dentro do bioma amazônico com uma variável que marca o período após a implementação da resolução. Foram adicionados ao modelo efeitos fixos de município e ano para controlar características persistentes do municípios e tendências temporais comuns, respectivamente. Ademais, foram adicionadas variáveis para controlar outras políticas ambientais.

Principais Resultados

Os resultados principais demonstraram que, na ausência da Resolução 3.545, o desmatamento total teria sido 2.000 quilômetros quadrados maior do que o efetivamente observado de 2009 a 2011 na amostra de 100 km de municípios, o que representa uma redução de 60% se considerado o desmatamento da linha de base em 2008. Ou seja, a resolução tem desempenhado um papel importante na contenção de desmatamentos no bioma amazônico.

Ademais, os resultados sugerem que a inclusão de monitoramento ambiental e controles de aplicação da lei não afetam os impactos da resolução, ou seja, que a resolução não afetou a concessão de crédito via redução da demanda de recebedores de crédito. Portanto, em geral, os resultados indicam que os efeitos da Resolução 3.545 sobre o desmatamento reflete diretamente a redução do desmatamento como resposta à redução do acesso ao crédito rural.

Entretanto, os autores salientam que a política pode ter tido efeitos diferentes em diferentes regiões. Assim, é explorada a heterogeneidade regional, observando como a relação entre crédito e o desmatamento podem diferir entre municípios com diferentes atividades. Nos municípios pecuaristas, a estimativa pontual é bastante semelhante às outras especificações. Em contraste, as estimativas sugerem que a Resolução 3.545 não teve impacto no desmatamento onde a agricultura é a principal atividade. Segundo os autores, isso é consistente com relatórios que documentam que a produção agrícola no Brasil tem sido menos dependente de crédito que, após as diversas melhorias tecnológicas, tem aumentado sua produção numa margem intensiva. Já em relação ao empréstimo de crédito, os resultados indicam que as concessões de crédito para uso na pecuária foram as mais afetadas pela Resolução 3.545 em comparação às outras atividades, sugerindo que o acesso à crédito e desmatamento estão particularmente correlacionados na atividade pecuária.

Portanto, os autores concluem que a Resolução 3.545 ajudou a conter o desmatamento no bioma amazônico. Em que a resolução teve efeitos negativos tanto no desmatamento quanto na concessão de crédito, em que a implementação real da nova política, de fato, apoia a suposição de que a resolução afetou o desmatamento apenas pelo canal de crédito.

Lições de Política Pública

O estudo sugere que o condicionamento do crédito rural é um instrumento de política eficaz no combate ao desmatamento ilegal. No entanto, os efeitos heterogêneos entre setores e regiões sugerem que é uma política complementar, em vez de substitutiva, de outros esforços de conservação.


[1] Na Amazônia, os embargos são uma sanção administrativa que pode ser aplicada a proprietários de terras como punição por desmatamento ilegal dentro de propriedade privada.