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ECONOMIA E GESTÃO.

COMO PROGRAMAS DE ASSISTÊNCIA DE EDUCAÇÃO INFANTIL CRIANÇAS AO LONGO DA VIDA?

28 jul 2023

Pesquisador Responsável: Bruno Benevit

Título Original: The Dynastic Benefits of Early Childhood Education

Autores: Jorge Luis García, Frederik H. Bennhoff, Duncan Ermini Leaf e James J. Heckman

Localização da Intervenção: Estados Unidos

Tamanho da Amostra: 123 crianças

Setor: Educação

Variável de Interesse Principal:  Custo-benefício do programa

Tipo de Intervenção: Assistência educacional

Metodologia: OLS, AIPW, LASSO, Probit

Resumo

O problema de mobilidade social de crianças afro-americanas representa um problema social persistente nos Estados Unidos. O estabelecimento de políticas voltadas para a mudança desse contexto é essencial, especialmente voltadas ao ambito educacional. Nesse sentido, diversos estudos investigaram os efeitos do Perry Preschool Project, programa focado no desenvolvimento educacional de crianças afro-americanas em situação de vulnerabilidade social.  Este estudo analisou os efeitos do programa em indicadores de educação, renda, crime e saúde ao longo da vida das crianças tratadas, além de apresentar diversas análises de custo-benefício para o programa. O estudo também apresenta novas evidências relacionadas aos efeitos de programas de educação infantil nos familiares. Os resultados indicam que o programa provocou melhorias em todos os indicadores, além de apresentar eficiência em termos de custo-benefício. Os mesmos efeitos foram identificados para os filhos e irmãos dos participantes originais tratados.

  1. Problema de Política

O problema de mobilidade social de crianças afro-americanas representa um problema social persistente nos Estados Unidos. O estabelecimento de políticas voltadas para a mudança desse contexto é essencial, especialmente voltadas ao ambito educacional. Nesse sentido, diversos estudos investigaram os efeitos do programa Perry Preschool Project (PPP) na mobilidade social de crianças afro-americanas em situação de vulnerabilidade social.

De acordo com Elango et al. (2016), ao menos 30% dos programas de educação infantil nos Estados Unidos foram baseados no PPP, destacando a relevância do programa. Esse tipo de programa têm o potencial aprimorar diversos fatores associados á mobilidade social dos participantes como educação, rendimentos, participação em crimes e saúde. Assim, entender os efeitos prolongados ao longo da vida dos participantes desse tipo de programa fornece informações relevantes para a avaliação de custo-benefício e para  a formulação de novas políticas voltadas ao desenvolvimento e à mobilidade social.

  • Contexto de Implementação e de Avaliação

O PPP foi realizado em Ypsilanti, Michigan, tendo sido projetado para estimular o desenvolvimento de habilidades cognitivas e não cognitivas de afro-americanas em situação de desvantagem social durante o início da década de 1960. A intervenção do programa consistia em sessões pré-escolares de 2,5 horas durante os dias úteis realizadas ao longo de dois anos, a partir dos três anos de idade. Adicionalmente, os participantes também receberam visitas semanais de professores em suas casas durante o período de tratamento de dois anos. Nenhum tipo de tratamento foi conduzido para as crianças do grupo de controle, e não havia substitutos de tratamento disponíveis na área onde viviam.

O grupo dos participantes do PPP eram representativos da população afro-americana desfavorecida nos Estados Unidos, e contando com 123 crianças afro-americanas em situação de desvantagem social. Segundo Heckman et al. (2010), 15% das mulheres afro-americanas e 17% dos homens afro-americanos nascidos nos Estados Unidos durante a década de 1960 teriam sido elegíveis para participar do PPP. Os autores calculam que essas porcentagens representem 10% para ambos homens e mulheres em 2021.

  • Detalhes da Política/Programa

O PPP selecionou de forma aleatória 123 crianças afro-americanas em situação de desvantagem social em grupos de tratamento e controle ao longo de cinco coortes durante o início da década de 1960. Critérios de elegibilidade dos participantes foram baseados em pontuações de QI e status socioeconômico a partir de pesquisas na escola, referências e visitas. Os participantes dos grupos de tratamento e de controle foram acompanhados em várias rodadas de coleta de dados até os 54 anos de idade. No acompanhamento aos 54 anos de idade, quando os dados sobre os irmãos e filhos adultos dos participantes originais foram coletados, 83% dos 123 participantes foram entrevistados; 12% dos participantes não foram entrevistados porque haviam falecido.

O processo de aprendizagem envolviam atividades de planejamento, execução e reflexão orientadas pelos professores. Os alunos e professores pertenciam à área de abrangência atendida pela Escola Primária Perry em Ypsilanti, Michigan. Os professores realizavam relatórios sobre o processo. Em termos de valores em 2017, o programa teve um custo total de 21.151 dólares americanos por participante (Barnett, 1996), incluindo custos operacionais (salários de professores e administração) e custos de capital (salas de aula e instalações). Esse valor foi utilizado como base para as análises de custo benefício desse artigo.

  • Método

A amostra utilizada foi construída a partir dos dados coletados pelos participantes do PPP em entrevistas realizadas, em média, aos 15, 19, 27, 40 e 54 anos de idade. Além dos participantes, as entrevistas também coletaram dados referentes aos seus irmãos e filhos (até 5 mais velhos) na entrevista realizada aos 54 anos de idade. Só foram considerados irmãos nascidos antes da implementação do tratamento e com até 5 anos de diferença do participante original do programa. Os dados apresentam informações das crianças sobre aspectos socioeconômics,  QI aos 3 anos de idade (início do programa), educação, renda, participação em crimes e saúde.

O estudo avalia como os participantes que sofreram a intervenção foram afetados em seu ciclo da vida em termos de educação, renda, participação em crimes e saúde. Com o intuito de fornecer maior robustez às evidências encontradas, foram aplicados os métodos econométricos de Mínimos Quadrados Ordinários (OLS), estimador aumentado de probabilidade inversa (AIPW), Operador de Encolhimento e Seleção Menos Absoluto (LASSO) e  Probit.

Para avaliar o custo-benefício do programa, os autores criaram uma variável de agregação dos benefícios agregados no ciclo de vida dos participantes a partir das variáveis de interesse elencadas acima. Os autores adotaram diversas abordagens presentes nas literaturas relacionadas de cada tema computar o benefício agregado de cada variável de interesse (García et al., 2021). A partir dessas computações, foram consideradas a razão entre o valor dessa variável de agregação e o custo do programa de duas formas: (i) considerando o custo de forma direta, equivalente à 21.151 dólares em 2017, e (ii) e considerando o custo multiplicando por 1,5 o montante de 21.151 dólares, de forma a considerar a perda de eficiência de 50% decorrente da arrecadação tributária para o financiamento do programa.

A análise principal do estudo apresentou estimativas dos efeitos da intervenção no custo-benefício para cada variável interesse referentes à educação, renda, crime, saúde e efeitos totais para os participantes do PPP. Foram considerados valores em dólares americanos de 2017 e aplicados descontos para o ano em que o programa começou usando uma taxa de 3%.

Os autores também conduziram uma série testes de robustez são utilizados para a verificação da validade dos resultados identificados, considerando métodos distintos de estimações, cenários otimistas e pessimistas em relação aos custos considerados, e formas alternativas de mensuração do benefício advindo da intervenção do programa.

Por fim, o estudo apresentou uma análise de custo-benefício para os participantes do grupo dos tratados, os seus irmãos, os seus filhos, a sua “dinastia” (participante original e seus filhos) e sua “dinastia estendida” (participante original, seus filhos e seus irmãos). Devido à idade dos filhos dos participantes, não foram realizadas análises sobre a saúde.

  • Principais Resultados

Os resultados da análise principal demonstraram que os indivíduos tratados auferiram menos anos sob educação especial e retenção no ensino básico (fundamental e médio), além de apresentarem acréscimo nos anos de educação formal. Devido à elevação na produtividade provocada por essa melhoria no capital humano, os maiores rendimentos do grupo de tratamento geram um aumento na base de impostos de rendimentos arrecadados. Segundo os autores, houve um benefício médio proveniente de renda de 43,4 mil dólares (após descontados os impostos). Foram identificados efeitos maiores para as mulheres nos rendimentos em relação aos homens.

Referente aos efeitos na participação em crimes, os resultados indicaram que os participantes tratados apresentaram menor participação em crimes, implicando em  redução nos custos de justiça criminal e nos custos monetários para as vítimas na ordem de 79,3 mil dólares.

Com relação ao impacto nas variáveis de interesse de saúde, as estimações apresentaram aumento nos gastos com saúde no grupo dos tratados. Esses aumentos ocorrem para ambos gastos médicos privados e governamentais. Esse comportamento pode ser explicado pela elevação na renda auferida para esse grupo, de forma que melhores condições de saúde superam expressivamente os gastos com saúde  (García et al., 2021). Adicionalmente, somado aos acréscimos nos gastos com saúde, o melhor comportamento de saúide dos tratados leva a uma taxa de mortalidade mais baixa aos 54 anos.

Ao considerar os benefícios oriundos da educação, renda do trabalho, custos do sistema de justiça criminal e custos do sistema de saúde, e custos de vitimização por crime, os resultados identificaram que a intervenção proporcionou uma razão de custo-benefício significativa entre 6,0 e 9,0 (considerando e não considerando a perda de eficiência, respectivamente). Os resultados mantiveram a sua validade após a condução dos testes de robustez.

A análise sobre as “dinastias” evidenciou que houve transbordamento do efeito positivo do tratamento para os filhos e irmãos dos participantes tratados. Os filhos e os irmãos dos tratados apresentaram maios gastos com educação, comportamento resultante da maior educação dos mesmos tal qual observado em relação à saúde. Assim como na análise principal, esses efeitos são compensados por acréscimos nos rendimentos dos familiares. Resultados análogos aos identificados na análise principal também foram identificados em relação ao comportamento criminal dos familiares dos participantes originais. Ao todo, os benefícios para os filhos e os irmãos adicionam 32,7 mil e 60,6 mil dólares ao benefício do programa, respectivamente. O valor presente ao longo da vida da “dinastia estendida” do programa aumenta para 286 mil dólares, implicando em uma razão de custo-benefício significativa entre 13,5 e 9,0 (considerando e não considerando a perda de eficiência, respectivamente).

  • Lições de Política Pública

Esse artigo verificou como a política de desenvolvimento social PPP impactou crianças afro-americanas em situação de vulnerabilidade social. Foram observados indicadores de educação, rendimento, participação em crimes e saúde ao longo da vida dos participantes do programa para estimar o impacto e o custo-benefício do programa, bem como os efeitos intrageracionais e extrageracionais.

Os resultados apresentam evidências robustas de que o programa foi efetivo na melhoria de todos os estimadores, além de apresentar eficiência em termos de custo-benefício e retornos. Além disso, o artigo apresentou novas descobertas em relação ao impacto de um programa de educação infantil nos familiares dos participantes originais. Essas evidências ressaltam a importância de políticas voltadas ao desenvolvimento e seus efeitos duradouros no âmbito individual e familiar.

Referências

BARNETT, W. S. Lives in the balance: age 27 benefit-cost analysis of the High/Scope Perry Preschool Program. Ypsilanti, Mich: High/Scope Press, 1996.

ELANGO, S. et al. Early Childhood Education. Em: Economics of Means-Tested Transfer Programs in the United States, Volume 2. [s.l.] University of Chicago Press, 2015. p. 235–297.

GARCÍA, J. L. et al. The Dynastic Benefits of Early Childhood Education. Cambridge, MA: National Bureau of Economic Research, jul. 2021. Disponível em: <http://www.nber.org/papers/w29004.pdf>. Acesso em: 13 jun. 2023.

HECKMAN, J.; MOON, S. H.; PINTO, R. Analyzing social experiments as implemented: A reexamination of the evidence from the HighScope Perry Preschool Program. Quantitative Economics, v. 1, n. 1, p. 1–46, 2010.