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COMO SUBSÍDIOS AFETAM A COBERTURA DE SEGUROS AGRÍCOLAS?

19 jan 2024

Pesquisador responsável: Bruno Benevit

Título original: Subsidy Policies and Insurance Demand

Autores: Jing Cai, Alain de Janvry e Elisabeth Sadoulet

Localização da Intervenção: China

Tamanho da Amostra: 3.442 famílias

Setor: Economia Política

Variável de Interesse Principal: Cobertura de seguro agrícola

Tipo de Intervenção: Subsídio

Metodologia: OLS, IV, RDD

Resumo

A renda e o consumo das famílias sofrem flutuações diante de diferentes formas de risco, em especial no contexto rural. Seguros formais para a proteção contra tais riscos, no entanto, não costumam apresentar adesão tanto em países desenvolvidos quanto países em desenvolvimento. Esse cenário implica em desafios enfrentados por diversos países na expansão da cobertura de seguros voluntária dos indivíduos. Para avaliar como políticas de subsídio impactam a adesão a seguros agrícolas, este estudo avaliou uma política de subsídio e instrução para seguros climáticos na China para famílias produtoras de arroz. Os resultados evidenciaram que as famílias que se beneficiaram da educação financeira aprimora a adesão permanentemente desses agricultores. No sentido oposto, os agricultores com pouco conhecimento sobre seguros atualizam continuamente suas decisões de adesão com base nas experiências recentes com desastres e pagamentos.

  1. Problema de Política

Os indivíduos lidam com os riscos de diferentes maneiras. A decisão de optar por seguros agrícolas é influenciada por diversos fatores, incluindo o nível de educação financeira, a percepção de risco, a experiência prévia com seguros, e a confiança nas instituições que oferecem esses produtos. Em muitos casos, a baixa valorização dos seguros está relacionada à falta de conhecimento sobre os benefícios a longo prazo e a raridade de eventos que acionam os pagamentos dos seguros. Além disso, barreiras econômicas, como o custo das apólices e a disponibilidade de subsídios governamentais, também desempenham um papel crucial (CAI; DE JANVRY; SADOULET, 2020).

Iniciativas governamentais que visam aumentar a adesão aos seguros agrícolas implementadas priorizam o acesso a subsídios, a divulgação de informações e o aprimoramento da confiança nos seguros. As evidências na literatura (BANERJEE et al., 2019; COLE et al., 2013), contudo, indicam baixa eficácia dessas políticas para lidar com a maneira como o conhecimento e a experiência em relação aos seguros influenciam a decisão dos indivíduos em aderirem a essa proteção.

Segundo os autores (CAI; DE JANVRY; SADOULET, 2020), existem três canais pelos quais uma exposição inicial ao seguro pode afetar a demanda por seguros a longo prazo: (i) o efeito direto de experimentar um pagamento, com um efeito positivo esperado na adesão se ocorreu um choque segurado e um pagamento foi recebido, e um efeito negativo de desencorajamento se um prêmio foi pago e nenhum choque ocorreu ou um choque ocorreu sem um pagamento correspondente; (ii) o efeito social de observar as experiências de pagamento na rede, que segue o mesmo processo de efeitos positivos e negativos em relação aos pagamentos estocásticos; e (iii) um efeito de formação de hábito, com o uso passado do produto influenciando a demanda atual.

  1. Contexto de Implementação da Política

O arroz é a produção agrícola mais importante na China, representando quase 50% dos da força de trabalho agrícola do país. Nesse contexto, em 2009 o governo chinês solicitou à Companhia de Seguros do Povo da China (PICC) a criação de uma apólice de seguro de produção de arroz para famílias rurais com o intuito de manter a segurança alimentar e proteger os agricultores de choques climáticos. Inicialmente implementado em 31 condados piloto, o programa foi expandido para 62 condados em 2010 e 99 em 2011.

O seguro de produção de arroz é baseado no índice de rendimento da área e cobre desastres naturais como chuvas intensas, inundações, tempestades de vento, temperaturas extremas e secas. Diferente do seguro baseado no índice climático, os pagamentos dependem da perda média na área. Se a perda de rendimento for de 30% ou mais, os agricultores recebem pagamentos proporcionais à taxa de perda, variando de 60 RMB por mu para uma perda de 30% até 200 RMB por mu para uma perda total.

Os custos de produção de arroz são de aproximadamente 400 RMB por mu, enquanto a renda bruta média é de cerca de 800 RMB por mu. O seguro cobria 25% da renda bruta ou 50% dos custos de produção, com um preço atuarial justo de 12 RMB por mu por temporada. A apólice era comercializada em fevereiro, antes da temporada de cultivo em março. Os prêmios eram deduzidos de um subsídio de produção de arroz depositado na conta bancária dos agricultores em janeiro, eliminando problemas de liquidez. Os pagamentos de seguros eram depositados diretamente na mesma conta bancária.

  1. Detalhes da Avaliação

Para avaliar o impacto das políticas de subsídio na adesão ao seguro, os autores conduziram um experimento de campo de dois anos entre 2010 e 2011, no qual foram concedidos subsídios de forma aleatorizada para 134 vilarejos com 3.442 famílias na zona rural da China. No primeiro ano, as políticas de subsídio ocorreram a nível de vilarejo, onde os produtores de arroz dos vilarejos selecionados receberam a oferta de seguro agrícola com um subsídio parcial de 70% do preço atuarial justo (custo mensal de 3,6 RMB).

Após as famílias definirem a adesão ao programa, o experimento separou os vilarejos em dois grupos: o grupo da “amostra não gratuita”, compreendendo os agricultores que aderiram ao programa de 72 vilarejos receberam o subsídio parcial inicialmente ofertado, e o grupo da “amostra gratuita”, compreendendo 62 vilarejos onde todas os agricultores receberam o subsídio total (independente da adesão ao programa). As amostras apresentaram adesão similar, variando entre 40% e 43%, de maneira que os usuários do seguro da “amostra não-gratuita” e da “amostra gratuita” contemplavam 43% e 100% das famílias, respectivamente.

No segundo ano do estudo, o nível de subsídio foi aleatorizado entre 90 e 40% do preço justo ao nível das familias, onde os agricultores tinham um preço atribuído aleatoriamente entre três opções de preço disponíveis no seu vilarejo. O programa também contou com um programa de educação financeira sobre produtos de seguro para os agricultores selecionadas aleatoriamente em 86 dos 134 vilarejos amostrados. Adicionalmente, aproximadamente 40% dos vilarejos da amostra foram sorteados para a opção default, onde a adesão ao programa estava designada previamente, cabendo aos agricultores a indicação de não adesão caso não desejassem o seguro.

A validade da aleatorização dos grupos e dos preços foram corroboradas pelos autores através de regressões nas características observadas dos agricultores, como gênero, idade e educação do chefe da família, tamanho da família, área de produção de arroz, aversão ao risco e percepção futura de desastres naturais.

  1. Método

O estudo considerou um modelo teórico Bayesiano para formalizar o processo de aprendizagem. Dessa forma, esse processo impactado pelo preço pago no primeiro ano através de três efeitos distintos: (i) um efeito de alcance, onde os subsídios aumentam a adesão e, consequentemente, a oportunidade de experimentar ou observar pagamentos; (ii) um efeito de atenção, onde um custo de seguro mais baixo para o indivíduo leva a menos atenção às informações geradas pelas experiências de pagamento; e (iii) um efeito de ancoragem de preço, onde preços baixos no passado reduzem a disposição atual de pagar.

Para estimar o impacto da política de subsídio para seguros agrícolas na China os autores conduziram diversas regressões de mínimos quadrados ordinários (OLS), verificando canais pelos quais uma exposição inicial ao seguro pode afetar a demanda por seguros a longo prazo. Primeiramente, foi verificado o efeito agregado da intervenção na adesão aos seguros, estimando-se curva de demanda aos preços dos seguros e o impacto da política de subsídio total aos produtores de arroz.

Posteriormente, analisou-se o efeito direto de experimentar o pagamento do prêmio do seguro agrícola. Para essa análise, foram estimados separadamente o efeito de usufruir do pagamento do prêmio diretamente e o efeito de presenciar o pagamento do prêmio por mais de 50% da rede de contatos do agricultores. Além do método de OLS, também foi conduzido uma regressão com descontinuidade (RDD) em torno do ponto crítico de 30% de perdas na safra. Para essa análise foram considerados apenas os agricultores que inicialmente aderiram ao programa.

Para verificar a existência de um efeito de formação de hábito no longo prazo, observou-se como recebimento passado de prêmios nos primeiros três anos e o acesso ao curso de educação financeira afetaram a adesão dos agricultores ao seguro agrícola no quarto ano. Para tal, estimou-se um modelo considerando o efeito isolado de ter recebido o prêmio do seguro para cada ano, identificado a partir de variáveis binárias, e os efeitos do recebimento do prêmio em mais de um ano (1º ano e 2º ano, 1º ano e 3º ano, 2º ano e 3º ano, e 1º, 2º e 3º anos). Por fim, os autores realizaram testes para verificar a memorização de perdas a partir de um modelo de mínimos quadrados em dois estágios (2SLS) considerando como instrumentos a interação entre a perda agrícola dos agricultores e variáveis binárias identificadoras dos agricultores do grupo “amostra gratuita”, do grupo default e de acordo com o preço sorteado no 2º ano.

  1. Principais Resultados

Os resultados referentes aos efeitos agregados do programa revelaram uma taxa de adesão 6 pontos percentuais (p.p.) maior para agricultores que receberam subsídio integral no primeiro ano em relação aos agricultores que receberam a oferta de subsídio parcial. A elasticidade-preço da demanda do seguro foi de -0,44 para o nível de preço subsidiado do programa (3,6 RMB). A adição de covariáveis aos modelos não alterou significativamente os resultados.

Com relação ao efeito de receber um prêmio no primeiro ano, os agricultores que receberam um subsídio parcial no primeiro ano apresentaram aumento na taxa de adesão no segundo ano entre aproximadamente 10 a 36 p.p., reduzindo o efeito preço em cerca de 80%. Para os agricultores que receberam subsídio integral no primeiro ano, essa elevação variou entre aproximadamente 5 e 17 p.p.. Os resultados foram significativos para ambas as estratégias empíricas. Os resultados também demonstraram um aumento de 20 p.p. na adesão ao seguro para agricultores que não aderiram ao programa no 1º ano e presenciaram o recebimento do prêmio de seguro por outros produtores, e nenhum efeito significativo para os que haviam aderido no 1º ano.

A análise referente à identificação da formação de hábito no longo prazo apresentou resultados indicando que a exposição ao curso de educação financeira influenciou no impacto a adesão dos agricultores ao seguro.  A adesão dos agricultores que não tiveram educação financeira só foi influenciada de forma positivamente significativa por recebimentos de prêmios no 3º ano, período anterior ao ano analisado (4º ano), enquanto que a adesão das famílias que tiveram educação financeira também foi afetada significativamente pelo recebimento de prêmios no 1º e no 2º ano, indicando maior compreensão dos benefícios do seguro por parte desses agricultores.

  1. Lições de Política Pública

Este artigo investigou o impacto das políticas de subsídio na adesão ao seguro de produção de arroz contra choques climáticos entre agricultores na China. Para tal, foi conduzido um experimento de campo aleatorizado de dois anos em 134 vilarejos no país, onde foram oferecidos subsídios parciais e totais, além de um programa de educação financeira.

As evidências deste estudo destacaram que os agricultores são moderadamente sensíveis ao nível do preço subsidiado dos seguros. A experiência de receber o prêmio de seguro aumentou significativamente a adesão ao longo do tempo, mesmo quando os subsídios foram reduzidos, destacando a relevância de uma experiência inicial bem-sucedida com o seguro. Além disso, o estudo destacou a importância da percepção de ganhos dos agricultores para a adesão a políticas de subsídio a seguros. O desenho dessa política revela como a melhor compreensão do programa por parte dos segurados pode induzir uma adesão continuada no longo prazo, contribuindo para a segurança financeira e a resiliência diante de choques climáticos na produtividade agrícola.

Referências

BANERJEE, A. et al. The Challenges of Universal Health Insurance in Developing Countries: Evidence from a Large-scale Randomized Experiment in Indonesia. Cambridge, MA: National Bureau of Economic Research, ago. 2019.

CAI, J.; DE JANVRY, A.; SADOULET, E. Subsidy Policies and Insurance Demand. American Economic Review, v. 110, n. 8, p. 2422–2453, 1 ago. 2020.

COLE, S. et al. Barriers to Household Risk Management: Evidence from India. American Economic Journal: Applied Economics, v. 5, n. 1, p. 104–135, 1 jan. 2013.