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Mulheres são menos corruptas que homens?

11 dez 2020

Pesquisador responsável: Angelo Cruz do Nascimento Varella

Título do artigo: WHAT HAPPENS WHEN A WOMAN WINS AN ELECTION? EVIDENCE FROM CLOSE RACES IN BRAZIL

Autores do artigo: Fernanda Brollo e Ugo Troiano

Localização da intervenção: Brasil

Tamanho da amostra:  723 disputas municipais para prefeitos

Grande tema: Gênero

Tipo de Intervenção: Comparação estatística dos níveis de corrupção entre prefeitos e prefeitas

Variável de Interesse principal: Níveis de corrupção

Método de avaliação: Avaliação Experimental (RCT)

Problema de Política

A corrupção política é um problema de grandes proporções no Brasil e no mundo. Sua ocorrência gera ineficiências na alocação de recursos públicos e acarretam problemas socioeconômicos em todas as camadas da sociedade. No intuito de combatê-la, pesquisadores e profissionais utilizam conhecimento técnico e pesquisas empíricas como poderosas ferramentas, que embasam as decisões de políticas públicas que buscam mitigar esse relevante entrave.

O presente texto trata de uma dessas pesquisas empíricas, de reconhecimento internacional, que busca avaliar a diferença entre homens e mulheres nas práticas de corrupção política. Na análise, são considerados vários aspectos desse problema de alto grau de complexidade, na tentativa de comparar atos corruptos entre prefeitos e prefeitas de municípios brasileiros, assim como definir quais características são mais comuns aos diferentes gêneros.

Contexto de Avaliação

Em geral, estudos empíricos indicam que a corrupção política é menor quando mulheres estão no poder, assim como essas representantes tendem a tomar decisões mais voltadas ao aumento do bem-estar social. No intuito de averiguar tais afirmações, os pesquisadores utilizaram dados de uma relevante iniciativa brasileira de combate à corrupção: as auditorias públicas municipais aleatórias. Implementado em 2003, o Programa de Fiscalização por Sorteios Públicos da Controladoria Geral da União (CGU) realizava análises das contas públicas de municípios brasileiros a partir de um sistema de loterias, com a intenção de avaliar as contas públicas e investigar a existência de atos corruptos ou alocações indevidas de recursos nas gestões municipais.

Além da análise das contas públicas nos municípios, a pesquisa também levou em conta outros fatores normalmente associados à corrupção política, comparando os resultados entre homens e mulheres em situações similares. Fatores como o uso de cargos comissionados, contribuições de campanhas, probabilidade de reeleição e alocação das verbas públicas também foram consideradas, construindo uma robusta análise acerca das diferenças de gênero no contexto político das prefeituras brasileiras.

Detalhes da Política

Para comparar as diferenças de gênero nas lideranças municipais os autores utilizaram diversas bases de dados integradas em um teste estatístico denominado regressão descontínua. O intuito é controlar o complexo cenário político brasileiro de modo a caracterizar uma comparação justa.

As análises englobam duas eleições para prefeitos em municípios com menos de 200 mil habitantes, contemplando os mandatos de 2001 a 2004 e de 2005 a 2008. Todas as informações referentes às eleições, assim como as informações relacionadas aos candidatos, são provenientes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Já os dados sobre corrupção foram coletados a partir dos primeiros 33 relatórios do programa da CGU, que caracteriza quatro tipos de corrupção política no poder municipal:

  1. Compras ilegais
  2. Fraude
  3. Superfaturamento
  4. Desvio de verbas

Os relatórios abrangem o período de maio de 2003 a julho de 2010. Outros dados complementares para o mesmo período são coletados a partir do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do Tesouro Nacional, do Ministério da Educação e do Ministério da Saúde.

Método de Avaliação

A partir dos dados coletados, os pesquisadores selecionaram as corridas eleitorais nas quais concorreram um homem contra uma mulher, correlacionando essas disputas com os dados complementares. Do total de 5.567 municípios apenas 723 eleições, entre os anos de 2000 e 2004, foram consideradas para a análise, representando 7% do total. Cabe ressaltar que, desses municípios selecionados, apenas 161 foram sorteados para auditorias no período analisado, o que caracteriza a amostra com informações sobre corrupção política. Outras informações complementares englobam:

 - Dados sobre os quatro tipos de atos corruptos;

- Características socioeconômicas dos municípios;

- Características individuais dos candidatos eleitos;

- Condições e quantidades de funcionários públicos nas prefeituras;

- Contribuições de campanhas;

- Se é candidatura à reeleição ou se já concorreu antes;

- Informações sobre contribuições de campanhas;

- Dados sobre a natalidade nos municípios;

- Dados educacionais nos municípios.

Principais Resultados

Os resultados observados colaboram com os achados empíricos de outros autores, de modo que as candidatas eleitas se envolveram em menos atos de corrupção, além de haver dedicado mais recursos ao aumento do bem-estar social. Cabe destacar que, das corridas eleitorais analisadas, foram eleitos 407 prefeitos e 316 prefeitas, o que representa uma porcentagem de 56% homens contra 44% mulheres.

No que se refere aos resultados de corrupção política, a probabilidade de candidatas eleitas praticarem algum dos atos corruptos listados pelos relatórios da CGU é de 29 a 35 pontos percentuais menor do que os candidatos do gênero masculino. No que tange as contribuições de campanha, prefeitas atraem entre 30% a 55% menos fundos privados (que eram legais nas eleições analisadas) do que candidatos homens. Os autores destacam o fato de que há um consenso na literatura de que contribuições privadas são recorrentemente associadas ao favorecimento das empresas contribuintes, o que corrobora com a hipótese de que mulheres participam em considerável menor proporção dos atos de corrupção comumente praticados na política brasileira. Há também outras explicações possíveis, como machismo por parte dos doadores ou maiores capacidades de articulações políticas por parte dos homens.

Outro fator associado com práticas corruptas refere-se aos cargos temporários, que são utilizados por indivíduos corruptos para trocas de favores políticos. As prefeitas analisadas contrataram, por meio de cargos comissionados, cerca de 64 indivíduos a menos do que os prefeitos, o que representa 52% do total de contratações feitas por homens. Em anos eleitorais, essa diferença aumenta para 80 cargos. Adicionalmente, apesar de terem a mesma probabilidade de concorrer à reeleição, a probabilidade de ser reeleita é 20 pontos percentuais menor do que prefeitos.

Em relação às demais informações analisadas, prefeitas tendem a atrair, em média, 60% a mais de receitas provenientes de órgãos estaduais e federais para investimentos seus municípios. Além disso, municípios comandados por mulheres apresentam melhores taxas em atendimento pré-natal, em partos normais e em infraestrutura escolar, o que também corrobora com outros estudos empíricos que demonstram que líderes femininas fornecem melhores bens públicos e aumentam o bem-estar social.

Lições de Política Pública

Existe uma vasta discussão na literatura acadêmica acerca das diferenças relativas ao gênero na política. No presente texto, assim como em outras pesquisas, líderes femininas apresentam menores níveis de corrupção política, assim como apresentam indícios que contrapõem a perpetuação de atos corruptos, como doações privadas para campanhas eleitorais e a contratação em excesso de cargos temporários, especialmente em anos com eleições. Em contraponto, a probabilidade de uma prefeita ser eleita é menor em relação a prefeitos, mesmo com condições similares, o que indica que tais atos indevidos podem afetar as campanhas municipais no Brasil.

Há muito o que ser discutido a respeito do tema, de modo que é possível que características sociais brasileiras representem fatores de influência que expliquem tais resultados. Destaca-se que, no entanto, os pesquisadores realizam testes paralelos no intuito de mitigar tais possibilidades, dando robustez aos resultados apresentados neste texto. Em função das características necessárias à representatividade, as candidaturas de mulheres a cargos públicos de poder devem ser incentivadas, assim como o monitoramento dos resultados deve ser constante, no sentido de colaborar com o debate acerca do tema e possibilitar as melhores condições possíveis para a política nacional.

Referência

BROLLO, Fernanda; TROIANO, Ugo. What happens when a woman wins an election? Evidence from close races in Brazil. Journal of Development Economics, v. 122, p. 28-45, 2016.