IDP

Ferramentas de acessibilidade

VLibras

Consulte aqui o cadastro da Instituição no Sistema e-MEC


ECONOMIA E GESTÃO.

O FORNECIMENTO DE CRÉDITO SUBSIDIADO AOS AGRICULTORES RURAIS MELHORA A SEGURANÇA ALIMENTAR?

20 jan 2022

Pesquisadora responsável: Eduarda Miller de Figueiredo

Autores: Günther Fink, B. Kelsey Jack, Felix Masive

Localização da Intervenção: Zâmbia

Tamanho da Amostra: 175 aldeias

Setor: Agrícola

Variável de Interesse Principal:  Trabalho e salários

Tipo de Intervenção: Empréstimos em dinheiro ou em milho

Metodologia: Avaliação Experimental

Na África Subsaariana há a incidência de chuvas, que resultam em apenas uma única colheita a cada ano. E, com o acesso a oportunidades formais de poupança é limitado, as reservas de alimentos são altamente sazonais, com pico pós-colheita e seu ponto mais baixo na “estação da fome”. A intervenção no grupo de tratamento foi através de empréstimos oferecidos no início da “estação da fome”: tratamento de empréstimo em dinheiro ou em milho. As regressões demonstram que os empréstimos durante a “estação da fome” resultam melhorias de bem-estar através de menores custos de empréstimos durante esse período. Ademais, sugerem que uma maior intensidade de tratamento está associada com maiores efeitos nos salários de equilíbrio geral. O fornecimento de crédito subsidiado aos agricultores rurais aumenta salários e produção agrícola, além de melhorar a segurança alimentar no período da “escassez da fome”.

  1. Problema de Política

Em ambientes agrícolas, baixos retornos para economizar e altos custos de empréstimos aumentam o custo de suavizar o consumo de uma safra para a outra, resultando em uma “estação de escassez” ou “estação de fome” distinta nos meses que antecedem a colheita.

Jayachandran (2006) mostra que a falta do acesso ao crédito leva ao aumento da oferta de trabalho e redução dos salários dos trabalhadores rurais sem-terra quando a economia está exposta a choques de produtividade agregada. Outras evidências sugerem altos retornos da sincronização de oportunidades de empréstimos ou investimentos com fluxos financeiros em ambientes agrícolas rurais, onde as receitas e os preços são altamente sazonais (Duflo, Kremer e Robinson, 2011; Burke, Bergquist e Miguel, 2019).

  1. Contexto de Implementação e de Avaliação

Na África Subsaariana há a incidência de chuvas, que resultam em apenas uma única colheita a cada ano. E, com o acesso a oportunidades formais de poupança é limitado e as alternativas informais têm baixo retorno e são acompanhadas por taxas de juros extremamente altas, as reservas de alimentos são altamente sazonais, com pico pós-colheita e seu ponto mais baixo na “estação da fome”.

Para cobrir as necessidades de curto prazo a maioria adas famílias da amostra do estudo relatam reduzir o consumo e vender mão de obra familiar nos mercados de trabalho locais. Essas vendas de mão de obra, normalmente ocorrem dentro de uma aldeia com fazendeiros em melhores condições contratando fazendeiros relativamente pobres. Assim, famílias mais pobres também relataram taxas mais altas nos empréstimos e, consequentemente, um maior produto marginal do trabalho sobre as famílias mais pobres durante a “estação da fome”.

No caso deste estudo, ele foi aplicado no distrito de Chipata na Zâmbia, que possuía uma população de 456.000 indivíduos em 2010, no qual, ¾ da população vivem em áreas rurais, com a agricultura em pequena escala como a principal fonte de renda. A média mensal de despesas das famílias rurais neste distrito foi estimada em US$ 122 (US$ 0,8 por pessoa-dia), ou seja, cerca de 1/3 da média nacional (US$ 389).

  1. Detalhes da Política/Programa

O estudo foi baseado no modelo de trabalho agrário de Jayachandran (2006), onde a economia de cada aldeia tem um número finito de famílias agrícolas que buscam maximizar a utilidade em 2 períodos. Assim, cada família tem recursos líquidos iniciais e precisam alocar a sua dotação de trabalho entre vendas para o mercado e trabalhar em fazendas próprias, que possuem produção heterogênea.

A pesquisa foi implementada entre outubro de 2013 e setembro de 2015, com dados cobrindo os três ciclos agrícolas (1 por ano), no distrito de Chipata, Zâmbia. Teve como alvo os agricultores de pena escala, ou seja, famílias com colheitas de menos de 5 hectares.

O experimento foi desenhado para coincidir com o ciclo da agricultura da região, que começa com a preparação de campo em setembro e segue em novembro com as atividades de plantio devido à época das primeiras chuvas. Entre janeiro e abril ocorre a remoção de ervas daninhas, que é a época conhecida como “estação da fome” ou “estação da escassez”. Em abril, as primeiras safras começam a tornar-se disponíveis e a colheita começa para valer em maio. Entre agosto e outubro poucas atividades agrícolas ocorrem.

O estudo incluiu dois tipos de tratamento de empréstimo que eram oferecidos no início da “estação da fome” em janeiro: (i) tratamento de empréstimo em dinheiro; (ii) tratamento de empréstimo de milho. O reembolso deveria ocorrer na colheita em julho, e os empréstimos poderiam ser pagos em dinheiro, em milho ou em ambos. Das 175 aldeias participantes do estudo, 58 (1.033 fazendas) foram selecionadas como grupo de controle, 58 (1.092 fazendas) são grupo de tratamento de empréstimo em dinheiro e 59 (1.095 fazendas) são grupo de tratamento de empréstimo em milho.

O empréstimo em milho ocorre através da oferta de 3 sacos de 50 quilos de milhos não picados. Visto que o milho é o alimento básico da colheita na Zâmbia e que 150 quilos fornecem grãos suficientes para uma família de 5 pessoas, por pelo menos 2 meses. O empréstimo em dinheiro fornece US$ 33 para as famílias, que corresponde aproximadamente ao valor dos 3 sacos de milho.

  1. Método

No ano 1 do programa, as aldeias foram divididas em 3 grupos de tamanhos iguais: controle, tratamento de empréstimo em dinheiro e tratamento de empréstimo em milho. Já no ano 2, foram selecionadas aleatoriamente 50% das aldeias tratadas no ano 1 para a continuação no programa e as outras foram eliminadas do programa. Além disso, 35% das aldeias do grupo de controle no ano 1 foram selecionadas aleatoriamente para algum dos tipos de tratamento no ano 2.  Com isso, os autores buscam três tipos de resultados principais: (i) alocação de trabalho e ganhos diários; (ii) produção agrícola; e (iii) consumo.

Foram estimadas regressões de intenção de tratar agrupado em tipos de tratamento para cada ano do estudo. A alta aceitação em ambos os anos significam que as estimativas estão muito próximas do efeito sobre o tratado. O modelo utilizado prevê que os efeitos do tratamento irão variar com as taxas de juros e os recursos líquidos disponíveis da família.

  • Principais Resultados

As estimativas identificam que a aceitação do empréstimo foi superior à 98% e as taxas de reembolso no ano 1 foi de 94%, o que demonstra que a alta aceitação não foi impulsionada por expectativas de inadimplência. Já no ano 2, a taxa média de reembolso foi substancialmente menor, 80%, o que pode ter sido impulsionado em parte pelas chuvas piores que ocorreram no período que ocasionou uma menor produção agrícola em 2015.

Em relação à demanda de trabalho e aumento nos salários de equilíbrio, os resultados sugerem que os empréstimos irão aumentar a demanda de trabalho entre os agricultores tratados, onde haverá aumento no trabalho familiar. Esses aumentos no trabalho familiar são consistentes com as restrições relacionadas ao consumo na oferta inicial de trabalho.

Em relação aos efeitos salariais de equilíbrio geral, comparando com os rendimentos relatados entre as famílias tratadas e as de controle, os resultados sugerem que a probabilidade de fornecimento de mão-de-obra para o mercado de trabalho também diminui com os empréstimos. Ademais, as estimativas indicam que uma maior intensidade de tratamento está associada com maiores efeitos nos salários de equilíbrio geral.

Os empréstimos durante a “estação da fome” resultam melhorias de bem-estar através de menores custos de empréstimos durante esse período. Além disso, resultam em um aumento na produção agrícola agregada devido a um sistema mais eficiente na alocação de trabalho. Portanto, os resultados apresentados pelo artigo destacam a importância das receitas sazonais, acesso ao crédito e liquidez para os mercados de trabalho e produção agrícola.

  • Lições de Política Pública

O fornecimento de crédito subsidiado aos agricultores rurais aumenta salários e produção agrícola, além de melhorar a segurança alimentar no período da “escassez da fome”.

Referência

FINK, Gunther; JACK, B. Kelsey; MASIYE, Felix. Seasonal liquidity, rural labor markets, and agricultural production. American Economic Review, v. 110, n. 11, p. 3351-92, 2020.