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ECONOMIA E GESTÃO.

Quais os impactos da adoção da urna eletrônica no Brasil?

15 jan 2021

Pesquisador responsável: Adriano Valladão Pires Ribeiro

Título do artigo: VOTING TECHNOLOGY, POLITICAL RESPONSIVENESS, AND INFANT HEALTH: EVIDENCE FROM BRAZIL

Autor do artigo: Thomas Fujiwara

Localização da intervenção: Brasil

Tamanho da amostra:  558 municípios

Grande tema:  Política Econômica e Governança

Tipo de Intervenção: Efeitos da adoção da urna eletrônica no número de votos válidos e no gasto público

Variável de Interesse principal: Votos válidos nas eleições

Método de avaliação: Regressão descontínua

Problema de Política

As escolhas de política econômica de qual será o tamanho do gasto público e o direcionamento em relação a quais setores da sociedade serão priorizados fazem parte do sistema político. Uma maior participação política das classes econômicas mais baixas, por exemplo, levaria a uma maior redistribuição a seu favor. No Brasil, a adoção da urna eletrônica aumentou a participação dos eleitores menos escolarizados e mais pobres, levando a implementação de políticas mais direcionadas a esse grupo.

Contexto da Avaliação

Na década de 1990, o Brasil passou a adotar a urna eletrônica nas eleições em substituição ao papel. Preencher um papel de votação, que seria um ato trivial para pessoas com algum nível de escolaridade, era um desafio na época, especialmente quando 23% dos adultos eram incapazes de ler e escrever. O problema se agravava uma vez que se requeria dos cidadãos escrever o nome do candidato para validar o voto e as instruções vinham por escrito. Isso acabava gerando uma quantidade enorme de votos nulos e brancos. Por outro lado, a urna eletrônica contém mensagens de erro quando se computa o voto como nulo ou branco, mostra a foto do candidato escolhido e tem uma orientação passo a passo de como votar. Ou seja, a urna eletrônica reduziu as dificuldades de se votar e levou a uma redução dos votos brancos e nulos.

A análise sobre os efeitos da introdução da urna eletrônica se dá sobre as eleições para o poder legislativo estadual de 1998. Nestas eleições a urna eletrônica foi usada pela primeira vez e, devido a oferta limitada, apenas os municípios com mais de 40.500 eleitores registrados puderam usar a nova tecnologia, isto é, os municípios abaixo dessa linha de corte continuaram usando o papel. Em sequência, avaliou-se se a inclusão dos eleitores menos escolarizados alterou o direcionamento das políticas públicas. Os estados com maior proporção de eleitores em municípios com mais de 40.500 eleitores registrados seriam os mais impactados pela introdução da urna eletrônica, pode-se então comparar a trajetória dos gastos públicos entre os estados para verificar os efeitos da maior participação da população menos escolarizada no processo eleitoral.

Detalhes da Intervenção

As informações sobre as eleições, como o número de eleitores registrados, quantos de fato votaram e os resultados, são disponibilizadas pelo Tribunal Superior Eleitoral para cada município. Dos 5281 municípios, todos os 307 que estavam acima do corte usaram a urna eletrônica. Além disso, para não haver confusão entre o efeito causado pelas urnas e as características dos municípios, usou-se os dados municipais disponibilizados pelo Censo do IBGE de 1991 para cada um deles. Por último, quanto ao efeito de se usar a urna eletrônica, considerou-se a razão entre o número de votos válidos (não nulos ou brancos) sobre o número de pessoas que compareceram na votação.

Por usar os votos para o legislativo estadual para avaliar o impacto das urnas eletrônicas, o foco das mudanças no orçamento se dá sobre os gastos do governo estadual, em particular, os gastos em saúde pública. As famílias mais pobres dependem mais do serviço prestado pelo sistema de saúde público do que as famílias mais ricas, logo uma mudança no gasto estadual em favor do sistema público de saúde pode ser visto como uma redistribuição em favor dos mais pobres. Além disso, os gastos em saúde são capazes de atingir diretamente os legisladores por ser uma demanda comum dos eleitores e esse é um tipo de gasto que pode ser alterado para aumentar sua participação no orçamento rapidamente. Especificamente, analisou-se tanto os gastos em saúde ao longo do mandato legislativo de 4 anos quanto o número de visitas ao médico durante a gravidez e o peso do recém-nascido.

Detalhes da Metodologia

O efeito de se usar a urna eletrônica pode ser capturado comparando a votação dos municípios próximos ao limite de 40.500 eleitores registrados, tanto para baixo quanto para cima do limite. A ideia é que os municípios próximos desse corte seriam semelhantes e a diferença na razão entre o número de votos válidos sobre o comparecimento seria causada pelo uso da urna eletrônica. Consequentemente, o grupo tratamento é definido como os municípios que adotaram a urna e o grupo controle os municípios que usaram o papel durante as eleições de 1998. Ressalta-se que os resultados são dados para os municípios próximos a esse limite, já que outras cidades muito grandes ou pequenas podem apresentar uma dinâmica de votação diferente. Por fim, resta delimitar para o quão próximo do corte os municípios devem estar para serem comparados uns aos outros, usou-se os intervalos de 20.000, 10.000 e 5.000 eleitores registrados.

Em sequência, para explorar a ideia de que a urna eletrônica teve maior impacto sobre a população sem escolaridade, repetiu-se o exercício de obter o efeito da adoção da urna eletrônica dividindo os municípios entre acima e abaixo da mediana da taxa de analfabetismo. Por fim, capturou-se o efeito da adoção da urna eletrônica sobre os gastos públicos em saúde. Como apenas algumas cidades adotaram a urna eletrônica nas eleições de 1998, alguns estados acabaram sendo mais afetados que outros, isto é, uma parcela maior do eleitorado de alguns estados teve acesso a urna eletrônica quando comparada a outros estados. A adoção em fases da urna por alguns estados permite então comparar se a evolução dos gastos em saúde também segue o mesmo padrão, em outras palavras, se os gastos públicos em saúde cresceram antes nos estados com uma maior parcela de eleitores com acesso a urna eletrônica.

Resultados

Seguindo a metodologia acima, o impacto obtido para a adoção da urna eletrônica é da ordem de 12 pontos percentuais sobre os votos válidos, ou seja, a urna eletrônica de fato causou um aumento no número de votos válidos onde foi adotada. Esse resultado é válido para os três intervalos usados. Ao considerar a taxa de analfabetismo dos municípios, o efeito da urna eletrônica ficou entre 15 e 18 pontos percentuais para os municípios com alta taxa de analfabetismo e apenas entre 9 e 11 pontos percentuais quando a taxa era abaixo da mediana, reforçando a ideia de que a participação dos menos escolarizados foi mais beneficiada.

Ao avaliar os gastos em saúde, a utilização dos serviços pela gestante e o peso do recém-nascido, a adoção da urna eletrônica também foi positiva. A transição completa entre votação usando papel para votação usando a urna gerou um aumento de 3,4 pontos percentuais na parcela do orçamento estadual destinada a saúde. A adesão da urna eletrônica levou a um aumento da parcela de gestantes com pouca ou nenhuma escolaridade que fazem mais de sete visitas pré-natal em 7 pontos percentuais e a uma redução de 0,5 pontos percentuais sobre a probabilidade de se ter uma criança abaixo do peso.

Lições de Política Pública

Duas lições podem ser aprendidas do estudo. Primeiro, o acesso a urna eletrônica implicou em uma maior taxa de votos válidos nas eleições, o resultado é ainda mais expressivo para as localidades com maior taxa de analfabetismo, ou seja, no contexto brasileiro, a adoção da urna eletrônica acarretou uma maior representação da população com menos escolaridade no processo eleitoral. Segundo, a maior participação do eleitor mais pobre e menos escolarizado leva os governantes a alocarem uma parcela maior dos gastos direcionados a esse público, isto é, acontece uma redistribuição do gasto em favor do eleitor mais pobre.

Referência

Fujiwara, Thomas. “Voting technology, political responsiveness, and infant health: Evidence from Brazil.” Econometrica, v. 83, n. 2, p. 423-464, 2015.