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ECONOMIA E GESTÃO.

Quais são os benefícios da votação eletrônica nos estados brasileiros?

23 mar 2022

Pesquisadora responsável: Viviane Pires Ribeiro

Título do Paper: Voting technology, political responsiveness, and infant health: Evidence from Brazil

Autores: Thomas Fujiwara

Localização da Intervenção: Brasil

Tamanho da Amostra: 5281 municípios brasileiros

Grande tema: Política Econômica e Governança

Variável de Interesse principal: Tecnologia de votação

Tipo de Intervenção: Análise da tecnologia de votação eletrônica nas eleições brasileiras

Metodologia: Regressão descontinua

Explorando um design de regressão descontinua na atribuição de tecnologia de votação na eleição de 1998, Fujiwara (2015) estima os efeitos da tecnologia de votação eletrônica na redução de um obstáculo “simples”, mas ainda assim importante, à participação política: dificuldade em operar cédulas eleitorais. Os resultados indicam que a votação eletrônica causou de fato uma grande emancipação de eleitores de menor escolaridade, o que levou à eleição de candidatos estaduais mais de esquerda, aumentou os gastos com saúde pública, utilização (visitas pré-natais) e saúde infantil (peso ao nascer). Os resultados são consistentes com as previsões dos modelos de economia política e demonstram que o voto eletrônico pode promover o empoderamento político da população de baixa renda e elevar seus padrões de vida.

Contexto da Avaliação

Preencher uma cédula eleitoral pode ser uma tarefa trivial para os cidadãos instruídos em países desenvolvidos, mas o mesmo não é verdade no Brasil, onde 23% dos adultos, com mais de 25 anos, são “incapazes de ler e escrever uma mensagem simples” e 42% não concluíram o ensino da 4ª série. Além disso, as cédulas de papel exigiam que os eleitores brasileiros anotassem o nome do candidato ou número eleitoral e não forneciam recursos visuais. A combinação desses dois fatores resultou em uma quantidade significativa de votos em branco e cheios de erros nas eleições, gerando um grande número de votos residuais (não atribuídos a um candidato e descartados da apuração dos resultados).

Em meados da década de 1990, o governo brasileiro desenvolveu uma tecnologia de votação eletrônica para substituir as cédulas de papel. Embora sua introdução visasse reduzir o tempo e os custos da contagem de votos, outros recursos da tecnologia, como o uso de fotos de candidatos como auxílio visual, o uso de mensagens de erro para eleitores prestes a lançar votos residuais e a orientação do processo de votação passo a passo, facilitaram a votação e reduziram os erros.

As eleições estaduais são realizadas no Brasil a cada quatro anos, e todos os estados têm a mesma data de eleição. Nas eleições de 1990 e 1994, somente cédulas de papel foram usadas. Nas eleições de 1998, a autoridade eleitoral decidiu que apenas os municípios com mais de 40.500 eleitores registrados (em 1996, quando ocorreram as eleições municipais) usariam a nova tecnologia eletrônica, enquanto os municípios abaixo desse limite usariam cédulas de papel. A regra de atribuição foi adotada devido à limitada capacidade de produção do fabricante e economias de escala na distribuição nos grandes municípios. Na eleição seguinte, a votação eletrônica se tornou o único método de coleta de votos.

Detalhes da Intervenção

Explorando um design de regressão descontinua na atribuição de tecnologia de votação na eleição de 1998, Fujiwara (2015) estuda a introdução da tecnologia de votação eletrônica nas eleições brasileiras, mais especificamente, o autor estima os efeitos da tecnologia de votação eletrônica na redução de um obstáculo “simples”, mas ainda assim importante, à participação política: dificuldade em operar cédulas eleitorais.

As informações sobre o registro eleitoral, participação e resultados eleitorais no nível municipal foram obtidas junto à autoridade eleitoral federal. A instituição também publicou relatórios listando os municípios que utilizaram votação eletrônica, mostrando um cumprimento quase perfeito da regra de atribuição descontínua. Todos os 307 municípios (de 5281) acima do corte de 40.500 eleitores usaram a votação eletrônica em 1998. Os dados adicionais sobre as características dos municípios são de tabulações do Censo Brasileiro de 1991.

De acordo com o autor, o principal resultado de interesse é o número de votos válidos (ou seja, não residuais). Um voto é considerado válido se, e somente se, puder ser atribuído a um determinado candidato ou partido e depois contado em sua parcela de votos. Um voto inválido é definido como voto residual. Portanto, a participação é igual à soma dos votos válidos e residuais. Um voto expresso em uma cédula de papel é considerado residual se for deixado em branco ou se o nome ou número escrito na cédula não corresponder a um candidato. Em votação eletrônica, um voto residual pode ser lançado pressionando o botão “em branco” ou digitando e confirmando um número que não corresponde a nenhum candidato.

Detalhes da Metodologia

Os resultados em nível estadual exploram o fato de que a atribuição descontínua nas eleições de 1998 criou diferenças específicas e incomuns no tempo de exposição entre os estados. A introdução progressiva da nova tecnologia foi realizada em três eleições consecutivas realizadas em 1994, 1998 e 2002.

Em 1994, somente cédulas de papel foram usadas. Em 1998, houve a atribuição descontínua com municípios acima de 40.500 eleitores registrados usando a nova tecnologia eletrônica, enquanto os municípios abaixo desse limite usaram cédulas de papel. Em 2002, apenas a votação eletrônica foi usada. Tal programação implica que a evolução da votação eletrônica em um estado é inteiramente determinada por uma variável transversal invariável no tempo: a proporção de eleitores que vivem em municípios acima do ponto de corte para seu uso em 1998.

Se um estado tiver S% de seus eleitores vivendo acima do limite de corte, S% de seus eleitores deixaram de usar papel para usar tecnologia de votação eletrônica entre as eleições de 1994 e 1998. Além disso, entre as eleições de 1998 e 2002, o restante (1-S)% dos eleitores mudaram para votação eletrônica. Consequentemente, os estados com maior participação de eleitores acima do limite de 40.500 eleitores experimentaram a maioria dos efeitos de emancipação da votação eletrônica antes dos estados com menor participação. Intuitivamente, a estratégia empírica testa se os resultados de interesse seguem esse mesmo padrão.

Resultados

As estimativas que exploram um design de regressão descontínua embutido em sua introdução progressiva ao longo do tempo indicam que o voto eletrônico reduziu os votos residuais (cheios de erros e não contados) e gerou de fato, a emancipação de uma grande fração (11%) do eleitorado. Essa maior participação política de eleitores com menor escolaridade (população de baixa renda) gerou: (1) aumento no número de candidatos estaduais eleitos que são eles próprios menos instruídos; e (2) desvio nos gastos do governo para a saúde pública, uma política que é particularmente benéfica à população de baixa renda; levando a (3) melhor utilização dos serviços de saúde (visitas pré-natais) por mães com menor escolaridade e (4) redução da ocorrência de partos com recém-nascidos de baixo peso neste grupo. Não foram encontrados, no entanto, efeitos sobre a utilização de cuidados de saúde por mães de maior escolaridade e sobre o peso de seus recém-nascidos.

As estimativas indicam que a emancipação de aproximadamente um décimo dos eleitores brasileiros aumentou em 3,4 pontos percentuais a parcela dos orçamentos dos estados gastos com cuidados de saúde, elevando os gastos em 34% em um período de oito anos. Também aumentou a visita pré-natal adequada das mães com menor escolaridade em 7 pontos percentuais e reduziu a prevalência de nascimentos com baixo peso em 0,5 pontos percentuais (respectivamente, uma mudança de 19% e -6,8% sobre as médias da amostra).

Lições de Política Pública

O estudo realizado por Fujiwara (2015) quantifica os efeitos da tecnologia de votação nas eleições estaduais brasileiras, demonstrando que, ao facilitar a operação das urnas, ela de fato emancipou um número significativo de eleitores (em sua maioria, eleitores com menor escolaridade). As estimativas que exploram o padrão único de introdução gradual da tecnologia nos estados ao longo do tempo sugerem que, conforme previsto pelos modelos de economia política, ela desviou os gastos do governo para a saúde, o que é particularmente benéfico para os cidadãos de baixa renda. Efeitos positivos tanto na utilização de serviços de saúde (consultas pré-natais) quanto na saúde do recém-nascido (partos com baixo peso) também são encontrados para mães com menor escolaridade, mas não para as com maior escolaridade.

Fujiwara (2015) então argumenta que essa emancipação dos cidadãos com menor escolaridade realmente afetou a política de uma maneira consistente com as teorias de redistribuição da economia política e democratização. Como a atribuição descontínua foi observada em eleições estaduais, o autor concentra-se nos gastos do governo estadual, em particular em uma área que afeta desproporcionalmente os menos instruídos: a saúde. Isto é, os brasileiros de baixa renda dependem principalmente de um sistema de financiamento público para os serviços de saúde, enquanto os eleitores de média e alta renda são mais propensos a usar os serviços privados.

A população de menor escolaridade tem, portanto, preferências relativamente mais fortes por serviços de saúde pública, e uma mudança nos gastos com cuidados de saúde pode ser interpretada como redistribuição para os de baixa renda. Consistente com essa interpretação, o autor também encontrou evidências que a votação eletrônica aumentou o número de consultas pré-natais por profissionais de saúde e reduziu a prevalência de nascimentos com baixo peso (abaixo de 2.500 g) por mulheres com menor escolaridade.

Por fim, o autor faz uma pequena advertência, isto é, os efeitos estimados podem depender de um contexto particular. O grau de alfabetização necessário para operar as cédulas de papel é maior em contextos com mais candidatos do que em contextos com menos candidatos, onde o nome e foto dos candidatos podem ser listados. Os outros resultados também podem depender de características do sistema político e de saúde brasileiro. No entanto, o estudo exemplifica como o aumento da participação política de grupos desfavorecidos pode mudar a formulação de políticas e afetar os resultados e, mais importante, fornece evidências que apoiam os mecanismos gerais na política redistributiva.

Referências

FUJIWARA, Thomas. Voting technology, political responsiveness, and infant health: Evidence from Brazil. Econometrica, v. 83, n. 2, p. 423-464, 2015.