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ECONOMIA E GESTÃO.

QUAIS SÃO OS “PROBLEMAS” DURANTE O PROCESSO DO USO DE EVIDÊNCIAS PARA A FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS?

10 ago 2022

Pesquisadora responsável: Eduarda Miller de Figueiredo

Localização da Intervenção: Reino Unido

Tamanho da Amostra: -

Setor: Políticas Públicas

Variável de Interesse Principal: -

Tipo de Intervenção: Análise de dados, entrevistas

Metodologia:  Outros

Resumo

O uso de evidências para a formulação de políticas vem crescendo com o passar dos anos. Entretanto, uma escassez de estudos sobre o processo dessa formulação de política. Assim, observando suas anotações durante seu trabalho como consultor de políticas no Reino Unido em 2009, o autor discorre sobre este processo de formulação de políticas com uso de evidências. Seus achados sugerem oito temas-chave que vão desde o compromisso com o uso de evidências até a dureza totêmica, passando pela questão das incertezas. Concluindo, portanto, que há um excesso de evidências, porém, inconclusivas.

  1. Problema de Política

             Nos últimos anos há uma grande discussão em torno da “política baseada em evidências” (Black, 2001; Boaz e Pawson, 2005). O estudo de Hill (2009) observa em sua análise uma escassez de estudo sobre o processo e a definição de formulação de política, que tende a ser examinado por meio da análise de resultados e não por meio de uma observação atenta. Também há uma dificuldade na definição de evidência, visto que para Monaghan (2008), a evidência é em si uma discussão politicamente carregada.

            Para o artigo aqui discutido, a formulação de políticas foi considerada como referência à tentativa organizada de selecionar objetivos e métodos para a ação governamental.

            Isto posto, este artigo buscou contribuir para o desenvolvimento de uma explicação do uso de evidências na formulação de políticas, utilizando dados etnográficos de um estudo sobre a prática de formulação de políticas no governo do Reino Unido.

  1. Contexto de Implementação e de Avaliação

            O autor conta que trabalhou como consultor de políticas por seis meses no ano de 2009 na seção de elaboração de políticas do serviço civil do Reino Unido. No qual sua equipe aconselhava os mais altos níveis do governo sobre políticas nas áreas de política social e justiça criminal, áreas altamente politizadas[1]. Com isso, o autor observou e participou do trabalho de formulação de políticas com o mínimo de reatividade, ou seja, o mais próximo do processo normal. Assim, ao participar do uso de evidências para fins de política, discutindo e observando o processo no seu dia-a-dia, o autor reuniu dados para desenvolver e testar a teoria.

  1. Detalhes da Política/Programa

             Durante a pesquisa do autor, ele salienta que o desconhecimento dos resultados acadêmicos pode ser parcialmente explicado pelas “inadequações” de pesquisas da área de ciências sociais para uso em evidências (Gans, 1971). As perguntas que os formuladores de políticas tendem a fazer incluem: o que deve ser feito na prática; como vai funcionar; quais serão os efeitos; quanto vai custar; haverá consequências adversas e sobre quem elas cairão. Em que haja muita pouca evidência disponível respondendo tais questionamento de maneira conclusiva para os formuladores de políticas (Tilley e Laycock, 2000).

            Um ponto importante é em relação sobre o esforço de narrativa para a criação de novas políticas, como Hajer (1995) salienta que acerca da importância de “contar histórias” para influenciar quais propostas serão adotadas.

  1. Método

            Seguindo uma abordagem de “codificação adaptativa”[2] (Layder, 1998), o autor gerou uma lista de códigos provisórios do seu trabalho anterior nesta área (Stevens, 2007) e da literatura existente. Ao codificar as notas de campo e transcrições das entrevistas, foram destacadas observações e citações relacionadas a esses códigos provisórios, além de gerar novos códigos à medida que outros conceitos surgiam nos dados.  

            A partir disto surgiram oito temas-chave:

  • Compromisso com o uso de evidências;
  • A supersaturação de evidências na política;
  • Relações intragovernamentais;
  • O controle da incerteza;
  • Competência burocrática e carreira no serviço público;
  • A terceira face da razão burocrática: encaixando a história;
  • O silêncio silencioso da desigualdade;
  • Dureza totêmica[3].
  1. Principais Resultados

            Neste tópico serão discutidos os dados encontrados pelo autor para cada um dos temas-chave:

  • Compromisso com o uso de evidências.

Foi observado que os funcionários públicos não são muito diferentes dos acadêmicos no sentido de demonstrar competência no uso da razão científica para ganhar reputações que levam à recompensa pessoal e profissional (Bourdieu, 2000). Onde os funcionários públicos com que o autor teve contato apresentaram-se ser altamente comprometidos com o uso de provas. Portanto, a evidência esteve presente no desenvolvimento, discussão e apresentação das políticas construídas que foram observadas.

  • A supersaturação de evidências na política

Foram encontrados quinze tipos de evidências que entraram em debates políticos, em que, além de dados governamentais coletados internamente e análises acadêmicas produzidas externamente, possuía-se pesquisas de opinião, relatórios de thinktanks e de consultoria de gestão, documentos políticos, e etc. Conforme discutido anteriormente, os formuladores de políticas devem escolher entre as poucas evidências disponíveis, ou seja, a evidência torna-se uma solução supersaturada de problemas políticos.

  • Relações intragovernamentais

Para obter aceitação, as propostas de políticas devem ser aprovadas por uma ampla gama de funcionários públicos sêniores, conselheiros especiais e, eventualmente, ministros de departamento. O autor observa que a narrativa, a qual era utilizada como um esforço para a aprovação da proposta, era um ponto em comum na criação de novas políticas, testemunhando o afirmado por Hajer (1995).

  • O controle da incerteza

O controle da incerteza fortalece a narrativa de um documento de política, mas também desempenha um papel mais amplo na estruturação do contexto em que os funcionários públicos operam.

  • Competência burocrática e carreira no serviço público

Se os servidores públicos se tornarem úteis para a tarefa de criar e executar políticas, terão mais probabilidade de atingir seus próprios objetivos de avanço profissional, assim, maximizando os dois tipos de utilidade: ser útil e a busca de objetivos pessoais. Portanto, o autor salienta que as pressões e incentivos que os servidores experimentam no desenvolvimento de suas carreiras, são importantes para entender como eles passam a utilizar evidências na formulação de políticas.

  • A terceira face da razão burocrática: encaixando a história

Os servidores devem apresentar propostas que sejam úteis a seus superiores e que possam ser aceitas na política governamental, portanto, as propostas devem se encaixar na narrativa existente da política governamental. Os funcionários públicos observados durante a pesquisa, a fim de conquistar um status mais elevados, em vez de desafiar, reforçavam os pressupostos fundamentais das narrativas políticas atuais.

  • O silêncio silencioso da desigualdade

É sugerido que os funcionários públicos aprendam a evitar a incerteza, complexidade e contradição durante a formulação de políticas. Onde o impacto causal e prejudicial da desigualdade é uma corrente de pensamento que influenciaram agendas políticas. Porém, durante sua análise, o autor percebeu que eram procurados programas que pudessem “manter uma tampa” sobre os efeitos da desigualdade, em vez de solucionar as causas.

  • Dureza totêmica

Aplica-se apenas aos grupos sociais visíveis, em que pobres e excluídos têm sido tão consistentemente “outros” na política criminal contemporânea (Young, 2007)

  1. Lições de Política Pública

            A análise até agora sugere que há um excesso de evidências, de maioria inconclusiva, e uma aversão à incerteza, complexidade e contradição nos círculos de formulação de políticas. O autor conclui, portanto, que a formulação de políticas por evidências uma atividade intensamente ideológica, pois reforça a distribuição desigual de poder.

Referência

STEVENS, A. (2011). Telling Policy Stories: An Ethnographic Study of the Use of Evidence in Policy-making in the UK. Journal of Social Policy, 40(2), 237-255. doi:10.1017/S0047279410000723


[1] Durante o seu trabalho como consultor de políticas, o autor realizou pesquisas documentais, desenvolveu propostas de políticas, representou em reuniões interdepartamentais, seminários e etc. Além das observações das interações entre colegas com funcionários públicos e assessores, realizou entrevista de 5 servidores públicos. Nem todos os contatos obtiveram consentimento informado, em razão da pesquisa aberta poder mudar o comportamento dos participantes, em razão de interesses de poder.

[2] Adaptative coding.

[3] Totemic toughness