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ECONOMIA E GESTÃO.

QUAL O IMPACTO DA COBERTURA DE SEGUROS DE SAÚDE NA MORTALIDADE?

04 ago 2023

Pesquisador responsável: Bruno Benevit

Título original: Health Insurance and Mortality: Experimental Evidence from Taxpayer Outreach

Autores: Jacob Goldin, Ithai Zvi Lurie e Janet McCubbin

Localização da Intervenção: Estados Unidos

Tamanho da Amostra: 8,9 milhões contribuintes

Setor: Saúde

Variável de Interesse Principal:  Cobertura de seguro saúde, Mortalidade

Tipo de Intervenção: Experimento, Divulgação

Metodologia: OLS, IV, Logit

Resumo

Apesar de diversos estudos sobre o tema, a relação entre seguros de saúde e mortalidade ainda é um tema amplamente discutido no ramo da economia da saúde. Dimensionar o impacto da cobertura de seguros de saúde é fundamental para aprimorar a efetividade de políticas de saúde. Este estudo objetivou avaliar o impacto do envio aleatório de cartas informativas da Receita Federal dos Estados Unidos para 3,9 milhões de domicílios que pagaram uma penalidade fiscal por não possuírem cobertura de seguro saúde do Affordable Care Act na cobertura de seguro de saúde e na mortalidade. Os resultados indicam que a intervenção elevou a cobertura durante os dois anos seguintes e reduziu a mortalidade entre adultos de meia-idade durante o mesmo período.

  1. Problema de Política

A relação entre seguros de saúde e mortalidade é um tema constantemente debatido na literatura economia da saúde. De acordo com os dados de Lurie e Pearce (2019), aproximadamente entre 9% a 13% dos americanos com menos de 65 anos não possuem cobertura de seguro de saúde durante todo o ano. A parcela de americanos que não possuem cobertura por pelo menos um mês durante o ano varia entre 21% e 26%. Com o objetivo de ampliar a cobertura do seguro de saúde, a lei federal Affordable Care Act (ACA) foi promulgada em 2010, tornando obrigatória a cobertura de seguros de saúde para a maioria dos contribuintes. Nesse sentido, mensurar como a cobertura de seguros de saúde impacta a mortalidade é essencial para os formuladores de políticas.

  • Contexto de Implementação e de Avaliação

A cobertura de seguro de saúde das pessoas nos Estados Unidos é majoritariamente fornecida pelos empregadores. Programas governamentais como Medicaid, Medicare ou a Administração de Veteranos representam a segunda maior fonte de cobertura. Os cidadãos americanos sem esses tipos de cobertura têm a opção de se inscrever em algum plano da Exchange, adquirido por meio do mercado de seguro de saúde do seu estado, ou em um plano fora da Exchange.

Diferentemente de programas como o Medicaid, os indivíduos só podem se inscrever em cobertura de seguro saúde via Exchange durante o período de inscrição aberta para o ano correspondente. Por exemplo, o período de inscrição para o ano de 2017 compreendeu o período de 1º de novembro de 2016 a 31 de janeiro de 2017. Além disso, os indivíduos são obrigados a solicitar cobertura da Exchange até o 15º dia do mês anterior ao mês em que a cobertura deve iniciar. A maioria dos planos privados oferecidos pelos empregadores também possui um período de inscrição similar, comumente encerrando-se próximo do final do ano civil.

No início de 2017, a Receita Federal dos Estados Unidos (IRS) enviou cartas informativas para os contribuintes que anteriormente haviam pago uma taxa de imposto de renda por falta de cobertura de seguro saúde, de acordo com a chamada provisão de mandato individual da ACA. Assim, essa intervenção permite a avaliação da relação causal entre a cobertura e a mortalidade dos contribuintes.

  • Detalhes da Política/Programa

Entre 2014 a 2018, a lei federal ACA passou a tornar a cobertura de seguro de saúde obrigatória para a maioria dos americanos, resultando no pagamento de uma taxa em caso de não cumprimento. Indivíduos que não possuíam cobertura de seguro de saúde qualificada para si mesmos ou para um dependente por um ou mais meses durante o ano eram obrigados a relatar e pagar a penalidade em sua declaração anual de imposto de renda, a menos que uma isenção se aplicasse.

 A intervenção do envio de cartas aos contribuintes foi financiado pelo Departamento de Saúde e Serviços Humanos (HHS) e executado pelo IRS. A carta informava aos destinatários que eles haviam pago uma taxa em 2015, fornecia informações sobre a penalidade e os custos do plano para 2017 e apresentava instruções a respeito da possibilidade de contratação da cobertura através do Exchange e do Medicaid.

Os destinatários que cumpriam os critérios para o recebimento da carta foram selecionados de forma aleatória, correspondendo a um grupo de que sofreu a intervenção (86%) e um grupo controle que não recebeu a carta (14%). A aleatorização foi estratificada por idade e sexo do declarante principal, estado civil, número de dependentes, renda, presença de renda de trabalho autônomo, status da penalidade/taxa de 2014 e se o estado do contribuinte expandiu o programa Medicaid e/ou participou do mercado federal Exchange durante 2017.

  • Método

A amostra utilizada foi construída a partir de declarações de imposto de renda do IRS apresentadas para o ano de 2015 constando a existência de penalidades positivas referentes ao ACA. Os autores adotaram diversos critérios de exclusão para a amostra, desconsiderando destinatários com endereço fora dos Estados Unidos e/ou inscritos na cobertura do Exchange em 2015 ou 2016. Os dados sobre cobertura de seguro saúde foram extraídos formulários entregues anualmente ao IRS por seguradoras privadas e públicas, empregadores com seguro próprio e mercados de seguro saúde (Formulário 1095 A/B/C), fornecendo informações mensais de cobertura em nível individual. Os formulários fornecem informações sobre a cobertura mensal e o tipo de cobertura em que o indivíduo estava inscrito (por exemplo, se a cobertura era Medicaid). Os dados de mortalidade são obtidos a partir do Social Security Death File, que registra a data de todos os óbitos nos Estados Unidos. A amostra final consiste em 4,5 milhões de declarações, correspondendo a 8,9 milhões de indivíduos (contribuinte principal, cônjuge, e até 4 dependentes).

As análises no estudo consideraram características dos indivíduos, do domicílio, da região/estado, da situação da penalidade do IRS e cobertura de 2014 e 2015. O período compreende os anos de 2015 a 2018, considerando o período de 2017 a 2018 como o período de tratamento. Não foram identificadas diferenças significativas nas médias das variáveis empregadas entre os grupos tratados e controles.

A primeira análise verifica como a intervenção afetou a cobertura dos contribuintes os meses sob cobertura de seguro de saúde e a probabilidade de estar coberto em ao menos um mês durante o período de 2017 a 2018. Foram estimadas regressões dividindo a análise considerando a amostra completa, apenas para segurados em todos os primeiros 11 meses de 2016, e apenas para os que não estiveram segurados durante todos os primeiros 11 meses de 2016. Adicionalmente, foram conduzidas as regressões sob o mesmos critérios de divisão e considerando apenas adultos entre 45 e 64 anos ao final de 2017.

A segunda análise procura identificar os efeitos da intervenção ao longo dos meses em termos de cobertura entre os grupos tratado e controle e de diferença entre os grupos. A terceira análise apresenta o efeito da intervenção para cada tipo de cobertura de seguro de saúde, dividindo as regressões entre amostra completa e adultos entre 45 e 64 anos.

As análises seguintes procuram identificar como a variação exógena na cobertura de seguro de saúde provocada pela intervenção explica a relação entre cobertura e mortalidade. Para tal, através dos métodos de OLS e IV, foram estimados os efeitos da intervenção na mortalidade, verificando se possíveis efeitos se deram em função de aumentos na cobertura de seguro de saúde e os efeitos de cada mês de cobertura induzido. Adicionalmente, foram conduzidos diversos testes de robustez com diferentes especificações das amostras em relação à idade, testes de placebo e análises em relação à heterogeneidade do efeito da cobertura provocada pela intervenção ao longo dos meses. Essas análises consideraram a amostra de adultos entre 45 e 64 anos, faixa etária com maior taxa de mortalidade.

  • Principais Resultados

Os resultados das análises das primeiras análises demonstraram que as pessoas sem seguro em algum mês ao longo de 2016 que sofreram a intervenção auferiram 1,1 ponto percentual a mais de probabilidade contratarem alguma cobertura de seguro de saúde nos dois anos seguintes à intervenção em comparação com o grupo de controle, representando um aumento relativo de 1,9%. Em média, a intervenção resultou em uma média de 0,23 meses adicionais de cobertura durante esse período, ou um ano adicional de cobertura para cada 52 indivíduos tratados.

Em relação aos efeitos por tipo de cobertura contratada, o efeito se deu majoritariamente via adesão à coberturas por Exchange e, em menor grau, através do programa Medicaid. A taxa de cobertura foi mais elevada entre o grupo de tratamento, apresentando redução na diferença entre os grupos tratado e controle no decorrer dos dois anos seguintes à intervenção.

Os resultados do efeito da cobertura adicional induzida pela intervenção evidenciaram redução na taxa de mortalidade para o grupo que solicitou alguma cobertura após a intervenção. A taxa de mortalidade entre pessoas de 45 a 64 anos anteriormente sem seguro foi menor no grupo de tratamento do que no grupo de controle em aproximadamente 0,06 pontos percentuais. Esse resultado correspondeu a uma morte a menos para cada 1.587 indivíduos tratados nos dois anos seguintes à intervenção. Não foram identificados efeitos para grupos além da faixa de 45 a 64 anos de idade.

A análise instrumental indica que o efeito médio por mês da cobertura induzida na mortalidade foi de aproximadamente -0,18 pontos percentuais ao longo dos dois anos após a intervenção. No entanto, os autores ressalvam que a magnitude do efeito na mortalidade mais confiável provavelmente seja de aproximadamente -0,04 pontos percentuais. Os resultados também evidenciam que o efeito anual na mortalidade é inferior a 12 vezes o efeito estimado por mês devido à concavidade na relação entre cobertura e mortalidade. Ou seja, os efeitos mensais vão reduzindo ao longo do período de 2 anos da intervenção.

  • Lições de Política Pública

Esse artigo forneceu evidências importantes relacionadas ao uso de estratégias de políticas de divulgação para aumentar a cobertura de seguro de saúde. Os resultados demonstraram que os grupos que apresentaram maiores reduções na mortalidade foram aqueles para os quais os benefícios da cobertura de saúde tendem a ser pequenos, especialmente quando a divulgação se refere a penalidades financeiras por permanecer sem seguro. Segundo os autores, tais resultados resultados sugerem que falta de atenção, moldando como os incentivos fiscais interagem com a seleção adversa no mercados de seguro de saúde, e provocando fricções comportamentais que reduzem a adesão à cobertura podem estar especialmente concentradas entre aqueles que se beneficiariam ao se inscrever. Diante de tal cenário, políticas de divulgação desse tipo apresentam efetividade na indução de cobertura de seguros de saúde.

Referências

LURIE, I. Z.; PEARCE, J. Health Insurance Coverage from Administrative Tax Data. Office of Tax Analysis Working Paper 117, 2019.