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Apenas aumentar os gastos em educação é suficiente?

20 abr 2021

Pesquisador responsável:  Adriano Valladão Pires Ribeiro

Título do artigo: INPUTS, INCENTIVES, AND COMPLEMENTARITIES IN EDUCATION: EXPERIMENTAL EVIDENCE FROM TANZANIA

Autores do artigo: Isaac Mbiti, Karthik Mutalidharan, Mauricio Romero, Youdi Schipper, Constantine Manda e Rakesh Rajani

Localização da intervenção: Tanzânia

Tamanho da amostra: 350 escolas

Setor: Educação

Tipo de intervenção: Transferência de recursos para escolas e professores

Variável de interesse principal: Aprovação nas avaliações de matemática, suaíli e inglês

Método de avaliação: Avaliação Experimental (RCT)

Problema de Política

Melhorar o sistema educacional de países em desenvolvimento é um desafio global, em que centenas de milhões de dólares são gastos anualmente de governos e doadores. Apesar disso, não é sempre que o aumento de gastos em educação é convertido em melhorias. Isso leva a crer que o aumento de recursos tem impacto limitado e outras restrições também teriam um papel importante em determinar os resultados educacionais. Uma restrição complementar aos gastos seria o esforço dispendido pelo professor, isto é, o fornecimento de materiais advindos do aumento dos gastos só aumentaria a qualidade do ensino se acompanhado de alto empenho do professor e vice-versa.

Contexto da Avaliação

A complementariedade destacada acima pode ser testada em um experimento na Tanzânia, lugar onde falta tanto recursos quanto motivação e esforço aos professores. Em 2001, as taxas escolares para o ensino primário público no país foram extinguidas, um passo importante para a educação primária universal com o crescimento no número de matrículas de 52% em 2000 para 94% em 2008. Não obstante, o nível de ensino se manteve baixo, em que apenas um terço dos estudantes do terceiro ano do ensino fundamental tinham as proficiências em matemática e alfabetização esperados de um aluno de segundo ano.

O rápido crescimento no número de matrículas não foi acompanhado pelo aumento de gastos em educação primária, resultando em falta de infraestrutura nas escolas, materiais básicos de ensino e uma média de quase 50 estudantes por professor. Além disso, um estudo do Banco Mundial revelou que um em cada quatro professores faltava ao trabalho e metade dos professores que estavam na escola ausentava-se das salas de aula. O conteúdo era ensinado por cerca de duas horas, menos da metade do programado, e 47% dos professores reportaram que escolheriam outra carreira se possível.

Detalhes da Intervenção

Identificado os problemas tanto de falta de recursos quanto de professores desmotivados, um programa para mitigar individualmente cada um desses empecilhos e um outro que atacava ambos ao mesmo tempo foram lançados. As intervenções foram implementadas pela Twaweza, uma organização composta pela sociedade civil no leste da África com foco nos cidadãos e na entrega de serviços públicos, em parceria com o governo para facilitar sua execução e avaliação. Destaca-se ainda que o programa foi aplicado a uma amostra nacionalmente representativa com 350 escolas em 10 distritos na Tanzânia ao longo de 2013 e 2014.

Algumas escolas foram selecionadas para receberem fundos extras por estudante que se adicionavam aos recursos inicialmente dispostos pelo governo. Os recursos foram anunciados pela Twaweza para as escolas participantes e alguns membros da comunidade que incluía também os pais dos alunos no início de cada ano escolar. Os recursos seriam transferidos para a conta da escola em duas parcelas, uma em abril e outra em agosto ou setembro, e a forma que seriam gastos era decidida pela direção das escolas. Apesar disso, as escolas deveriam prestar contas, registrando e compartilhando publicamente com a comunidade informações sobre as receitas e o dispêndio dos recursos.

O programa para incentivar o docente previa um valor em dinheiro a ser pago ao professor baseado na performance de seus estudantes em uma avaliação independente conduzida pela Twaweza. Dada a ênfase ao início do ensino primário, o programa foi limitado aos docentes do primeiro ao terceiro anos e focou nas disciplinas de matemática e alfabetização em inglês e suaíli (idioma oficial da Tanzânia). A regra adotada foi simples e dependia apenas do número de alunos aprovados nessas avaliações. Por fim, as escolas nomeadas para os dois programas seguiriam os mesmos protocolos acima. Ressalta-se a diferença entre a transferência de recursos para as escolas, que era incondicional, e o incentivo aos professores, que dependeria dos resultados dos alunos no teste.

A seleção das escolas participantes em cada programa foi feita de maneira aleatória. Primeiro, os 10 distritos foram randomicamente selecionados. Em seguida, sorteou-se as 35 escolas participantes, em que 7 receberiam a transferência de recursos, 7 teriam apenas o incentivo ao professor, 7 participariam de ambos os programas e as demais 14 formariam o grupo controle não recebendo nenhum recurso.

Detalhes da Metodologia

As variáveis usadas para a avaliar os efeitos dos programas foram os resultados nos testes de matemática, inglês e suaíli. A forma randômica de seleção das escolas para o grupo controle ou tratamento permite comparar os impactos da transferência de recursos, do incentivo aos professores e de ambos, uma vez que as diferenças nas médias dos resultados dos exames poderiam ser computadas ao programa adotado. A ideia é que, ao considerar as características individuais das escolas, dos professores e dos alunos, a desigualdade observada nas avaliações passaria a ser explicada totalmente pela implementação do projeto. Isto é, o único elemento que explicaria a diferença nos produtos de interesse entre as escolas do grupo controle e do grupo tratamento seria, assim, a participação em um dos programas.

Resultados

A avaliação da transferência de recursos para as escolas isoladamente indica que os fundos foram gastos principalmente com livros e materiais de sala de aula, como quadros, giz e mapas. Outros dispêndios foram administrativos e de apoio aos alunos, tais quais segurança e alimentação. Nota-se também que a despesa por aluno foi o dobro do valor se comparada ao grupo controle e não houve nenhum aumento de gastos com os professores por norma do programa. Em relação as avaliações, seguindo a metodologia acima não encontrou-se nenhuma diferença nos resultados dos exames entre as escolas do grupo controle e as escolas que receberam apenas a transferência de dinheiro. Ou seja, apesar dos gastos por aluno terem, de fato, aumentado, nenhum efeito no aprendizado foi constatado.

As escolas com apenas incentivos aos professores indicaram um aumento na aprovação dos exames. Ao final do segundo ano os alunos eram 37%, 17% e 70% mais prováveis a passarem nos exames de matemática, suaíli e inglês, respectivamente. Por último, as escolas que receberam o auxílio financeiro e o incentivo aos professores também registraram um aumento no gasto por aluno similar às escolas que receberam apenas os fundos extras. Contudo, dessa vez, os impactos nos resultados das avaliações foram positivo, ao final do segundo ano a probabilidade de passarem nos testes de matemática, suaíli e inglês cresceram, respectivamente, 49%, 31% e 116%. Nota-se que os efeitos da combinação dos programas foram ainda maiores do que os apontados apenas pelo incentivo aos professores.

Lições de Política Pública

Os resultados acima evidenciam que há diversos fatores restringindo o avanço da qualidade educacional nos países em desenvolvimento e que apenas o aumento dos gastos por aluno não é suficiente. Além disso, mitigar somente alguns e não outros fatores pode também limitar as melhorias. Outra lição a se destacar é que mais financiamento para a educação pode aumentar o aprendizado quando acompanhado de melhores incentivos para o uso efetivo dos recursos. No caso, existiam regras claras a serem adotadas pelas escolas para prestarem contas, a informação era disponibilizada para o público geral e, principalmente, para a comunidade afetada e um modelo simples de incentivo aos docentes.

Referência

MBITI, Isaac; MURALIDHARAN, Karthik; ROMERO, Mauricio; SCHIPPER, Youdi; MANDA, Constantine; RAJANI, Rakesh. “Inputs, Incentives, and Complementarities in Education: Experimental Evidence from Tanzania”. The Quarterly Journal of Economics, Volume 134, Issue 3, August 2019, Pages 1627–1673, 2019.