Pesquisador responsável: Bruno Benevit
Autores: Mounir Karadja e Erik Prawitz
Título original: Exit, Voice, and Political Change: Evidence from Swedish Mass Migration to the United States
Localização da Intervenção: Suécia
Tamanho da Amostra: 1,1 milhão de emigrantes
Setor: Economia Política
Variável de Interesse Principal: Participação em movimentos trabalhistas
Tipo de Intervenção: Emigração
Metodologia: OLS, IV
Resumo
O processo migratório entre países pode implicar em diversas consequências econômicas e políticas. Esse fenômeno pode afetar tanto os países que recebem o fluxo imigratório quanto os países que passam por um processo emigratório, este comumente envolvendo um movimento em massa decorrente de questões internas dos países. Para analisar a emigração em massa de suecos para os Estados Unidos ao longo das décadas, este estudo verificou os seus impactos em aspectos políticos da Suécia. Os resultados demonstraram que o processo de emigração sueco acarretou em aumento na filiação no partido trabalhista, participação em greves e participação em votação, além da adoção de instituições políticas mais inclusivas e do aumento do gasto em programas de bem-estar social.
O processo migratório envolve simultaneamente fluxos de emigração e imigração, ocorrendo devido a aspectos políticos, econômicos e sociais. A Era da Migração em Massa, que teve início no século XIX, marcou um período significativo na história global, com aproximadamente 30 milhões de europeus deixando seus países de origem em busca de oportunidades nos Estados Unidos (KARADJA; PRAWITZ, 2019). Esse movimento maciço de pessoas não só transformou as paisagens demográficas dos países envolvidos, mas também teve profundas repercussões políticas e sociais.
Nos países de origem, a migração em massa influenciou a estrutura sindical, com evidências de que os países com grandes populações emigrantes, como Itália, Alemanha, Irlanda e Suécia, apresentaram taxas mais altas de sindicalização. Além disso, a migração em massa coincidiu com um aumento na democratização, com muitos países europeus adotando instituições democráticas e expandindo o direito ao voto. Essas mudanças sugerem que a política de fronteiras abertas dos Estados Unidos durante esse período pode ter desempenhado um papel crucial no desenvolvimento político tanto no Novo Mundo quanto no Velho Mundo. Estudos adicionais são necessários para compreender melhor essa relação complexa entre migração em massa, sindicalização e democratização.
A Suécia vivenciou fortes geadas na década de 1860, resultando em um severo choque negativo em seu setor agrícola, setor econômico preponderante no país (KARADJA; PRAWITZ, 2019). Paralelamente, durante o final do século XIX e o início do século XX, existia grande tensão entre as elites econômicas e políticas suecas e os trabalhadores em torno de melhores condições de trabalho e direitos. O movimento trabalhista era majoritariamente representado pelos sindicatos trabalhistas e pelo Partido Social Democrata, partido que governou a Suécia durante a maior parte do século XX. Nesse contexto, os sindicatos incentivaram a emigração, impondo pressão às elites econômicas e políticas para o atendimento de demandas dos cidadãos (BEIJBOM, 1995).
Portanto, a emigração apresentara grande interação com aspectos trabalhistas e políticos no país, sugerindo possíveis implicações decorrentes de tais movimentos demográficos. Segundo os autores, as primeiras ondas de emigração potencialmente induziram a possibilidade de opções melhores de emprego para emigrantes suecos subsequentes na medida em que provocaram a redução de custos de movimentação (KARADJA; PRAWITZ, 2019).
A emigração em massa experimentada pela Suécia desde o século XIX foi um fenômeno que se estendeu por várias décadas. Tendo como fundamento os mecanismos apresentados por Kapur & McHale (2005), o estudo explorou quatro canais para explicar as ondas migratórias da Suécia para os Estados Unidos:
O estudo empregou uma série de fontes de dados referente ao período entre as décadas de 1860 e 1940, onde a economia do país, majoritariamente agrária no início no século XIX, passou por forte industrialização ao longo desses anos. As fontes utilizadas compreenderam dados da Igreja Estatal na Suécia, das companhias de navegação, do Instituto Meteorológico e Hidrológico Sueco, do Arquivo do Movimento Socialista, do Arquivo Nacional da Suécia e de relatórios governamentais diversos.
Os dados abrangeram aspectos no nível municipal da emigração, participação em votação, movimento trabalhista, participação em greves, dados diários climáticos, performance das colheitas agrícolas, gastos públicos sociais e tipo de instituições políticas. Adicionalmente, foram consideradas as taxas de mortalidade de crianças e mães, além de microdados demográficos do sexo, estado civil, estrutura familiar e ocupação agregados no nível municipal. Os dados de emigração provenientes da Igreja Estatal na Suécia foram comparados aos registrados pelas companhias de navegação, indicando confiabilidade nos dados considerados. A amostra final do estudo continha ao todo 1,1 milhão de emigrantes entre 1867 e 1920.
Este estudo procurou estimar o impacto das primeiras ondas de emigração da Suécia para os Estados Unidos, verificando se esse fluxo inicial proporcionou opções melhores de emprego para emigrantes suecos subsequentes. Assim, utilizou-se um modelo de Mínimos Quadrados Ordinários (OLS) para estimar o impacto do logaritmo da emigração acumulada em relação ao ano de 1867 nas variáveis de resultado políticas
Simultaneamente, estimou-se o efeito dos choques de geadas locais na Suécia vivenciados entre 1864 e 1867 no processo emigratório sueco e suas implicações no ambiente político do país. Para tal, utilizou-se o desvio padrão dos níveis de temperatura como estratégia de identificação para os choques de geadas na emigração, sendo posteriormente considerado um instrumento de interação dos choques de geadas com a distância aos dois portos de emigração mais próximos. A utilização do termo de interação como instrumento permite estimar a emigração evitando com que os efeitos diretos de choques econômicos afetem os resultados.
Como variável de resultado principal do ambiente político na Suécia, observou-se como a adesão ao movimento trabalhista local foi afetada, definida como uma única variável que identifica o número de associados a sindicatos e o número de filiados ao Partido Social Democrata entre 1900 e 1920. Além disso, também foram estimados os impactos nos gastos de bem-estar social e no tipo de instituições políticas (democracia direta ou representativa).
Com o intuito de corroborar o mecanismo apresentado pelos autores, foram verificados os efeitos das geadas na produtividade agropecuária na Suécia. Como estratégia de robustez, verificou-se o balanço entre as covariáveis pré-determinadas, realizaram-se testes de placebo considerando outros períodos para os eventos dos choques de geadas, e foram considerados modelos controlando possíveis impactos do acesso dos municípios a portos (em termos de distância).
Os resultados encontrados apresentaram evidências robustas de efeito positivo da emigração em vários aspectos políticos na Suécia. A estimativa preferida identificada sugeriu que um município que duplica sua emigração ao longo de um período de 30 anos aumenta a filiação ao movimento trabalhista local em 2,3 pontos percentuais (p.p.). Esse impacto corresponde a mover um município da média para o 90º percentil da distribuição das taxas de filiação. Além disso, observou-se que esse padrão se desenvolveu de forma crescente ao longo dos anos de 1890 a 1920, sugerindo relação com a industrialização tardia na Suécia e o crescimento do movimento trabalhista decorrente desse setor nascente. Relacionado às tensões políticas entre empresários e trabalhadores, os resultados também indicaram que o aumento da emigração aumentou significativamente a participação dos trabalhadores na greve geral de 1909. Tal efeito foi mais elevado entre os trabalhadores sindicalizados, indicando que a emigração trouxe efeitos persistentes na participação em movimentos trabalhistas.
Com relação a consequências na performance dos partidos de esquerda nas eleições entre 1911 e 1921, as estimativas indicaram que um aumento de 10% na emigração provocou uma elevação de 1,2 p.p. na parcela de votos para partidos de esquerda, com efeitos mais fortes nas eleições mais próximas do início do processo emigratório. Complementarmente, os resultados encontrados também indicaram que um aumento de 10% na emigração induziu um aumento de 0,8 p.p. no comparecimento de eleitores nesse período, marcado pelo estabelecimento do sufrágio universal em 1921. Os autores também identificaram que esse efeito permaneceu persistente até as eleições de 1998 a 2014, embora em escala menor.
Em termos de políticas sociais, os resultados identificaram que os gastos municipais com programas de bem-estar social aumentaram 40% acima da média, na medida em que a emigração duplicou. Adicionalmente, estimou-se que essa mesma escala de elevação na emigração provocou um aumento de 4,7 p.p na probabilidade de adoção da democracia representativa, institucionalmente mais inclusiva em relação à alternativa de democracia direta, comumente capturada pelas elites devido a baixa participação popular.
Referente aos possíveis mecanismos que explicam a mudança política, destacam-se as evidências confirmando o aumento do poder de barganha dos trabalhadores. Nesse sentido, observou-se que locais com mais redes de migrantes têm maior probabilidade de emigrar durante anos em que a diferença entre o PIB dos Estados Unidos e da Suécia é maior. Além disso, mesmo quando os trabalhadores em toda a Suécia migraram para outras partes do país para aproveitar os salários mais altos no setor industrial, essa opção aparentemente não era atraente para aqueles que poderiam emigrar facilmente em vez disso. Como consequência, observou-se o aumento significativo no salário dos trabalhadores, inclusive os de baixa qualificação.
Este artigo examinou como a emigração em larga escala da Suécia para os Estados Unidos observada no período da Era da Migração em Massa afetou o desenvolvimento político do país escandinavo. Através de um instrumento baseado nos custos de viagem e nos graves choques agrícolas que iniciaram a migração para os Estados Unidos, verificou-se que a emigração causou taxas significativamente mais altas de organização trabalhista, participação em greves, comparecimento às urnas e votação de esquerda a longo prazo. O processo de emigração dos suecos melhorou as opções externas dos cidadãos conectados, implicando em efeitos positivos no apoio e na implementação da redistribuição durante um período em que a Suécia ainda não era democrática. A relevância da migração no estabelecimento da democracia representativa e na expansão de direitos trabalhistas em meio a uma industrialização nascente na Suécia destaca a importância das dinâmicas de barganha entre os cidadãos e as elites no fomento de instituições políticas mais inclusivas.
Referências
BEIJBOM, U. Mot löftets land: den svenska utvandringen. Stockholm: LTs förlag, 1995.
KAPUR, D.; MCHALE, J. Give us your best and brightest: the global hunt for talent and its impact on the developing world. Washington, D.C: Center for Global Development, 2005.
KARADJA, M.; PRAWITZ, E. Exit, Voice, and Political Change: Evidence from Swedish Mass Migration to the United States. Journal of Political Economy, v. 127, n. 4, p. 1864–1925, ago. 2019.